Entre o olhar e o clique: o que restou da amizade?

Há algum tempo reflito sobre nosso papel na sociedade, sobretudo no comportamento nas relações humanas. Nesse cotidiano frenético, vivemos conectados ao celular — extensão do corpo, mas não da afetividade. Ampliando uma frieza e superficialidade própria de nosso tempo, em que para pessoas como eu tendem a sofrer mais.
Lembro que antes era comum os encontros pessoais em bares, colegiados na universidade e encontros para conversas variadas nas casas ou apartamentos. Com a ampliação das relações através das redes, ocorreu o aumento da “fluidez” que tornam estes momentos superficiais. O círculo de “amigos” aumentou nas redes ditas sociais, no entanto, esfriou a importância do conhecer. Ser amigo hoje não é necessariamente sinônimo de saber o que o outro pensa, gosta, de onde veio, qual cultura tem assim por diante.
Do mesmo modo que é fácil tornar amigo, sua desamizade ocorre da mesma forma. Basta não gostar de algo que escreveu, ou ter um desajuste de pensamento que não concordando, já não mais se suportam. Há casos, que tornam inclusive inimigos. Este tipo de amizade, perde aquilo que podemos chamar de condição ética da relação. No sentido de não mais ter atenção ao cuidado com outro, lealdade e alteridade. Essa chamada “amizade de botão”, refere-se a uma lógica de “conexões” rápidas.
Bauman, no livro “Amor Líquido: Sobre a Fragilidade dos Laços Humanos”, nos explica que “as relações são vistas e tratadas como coisas a serem consumidas, não produzidas. Desejadas enquanto dão prazer, descartadas quando deixam de satisfazer”. Nesse momento, sabe-se que existe o medo da solidão. No entanto, as pessoas não querem se comprometer e, pretendem ficar distantes o bastante para não se sentirem presas. Isso, tanto na relação afetiva quanto de amizades.
A “amizade antiga” acredita-se ser a forma de resistência a modernidade líquida ocorrida nas relações. O modo “antigo” de ser, pode ser fundamental para manutenção das relações autênticas. Ouvimos sempre que a sociedade está “doente” de afeto. Princípios fraternos, respeito ao próximo, equidade, são cada vez mais utópicos e parte de textos e discursos. Distante da praticidade e relação diária. Como enfrentar isso? Eu convido para uma cerveja e fico presente. Não deixem de olhar nos olhos.
Dione Castro
01.11.2025








