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O sonho (inviável) da moeda única

A proposta de criar moeda única, apresentada pelo presidente Lula na reunião com os demais governantes da América do Sul, não pode ser encarada como coisa séria. Assim como qualquer tentativa de uniformização ideológica do continente, pois cada país tem sua própria história, interesses e sensíveis diferenças que não podem ser homogeneizadas. A própria população de cada unidade do bloco a se formar não concordaria em mudar seus hábitos e objetivos só porque o vizinho tem características diferentes das suas.

Embora louvável a tentativa de unir os países para trabalhar em bloco continental, é deplorável o pontapé inicial que colocou em segundo plano teses em que as nações podem trabalhar juntas, priorizou a questão da moeda e – pior ainda – a defesa do indefensável governante venezuelano, Nicolás Maduro que, visto do lado brasileiro, já produziu mais de 100 mil refugiados de seu país que tivemos de acolher por razões humanitárias. Tanto que os os presidentes do Chile (de esquerda) e do Uruguai (de direita) uniram-se para contestar a criticar a postura do brasileiro em relação ao venezuelano.

Voltando à moeda, Lula deveria lembrar das dificuldades que Itamar Franco e Fernando Henrique Cardoso tiveram para implantar o Real, a nossa moeda que serviu para combater a inflação galopante, mas exigiu muitas concessões do ponto de vista econômico. Não deveria ignorar também os problemas para a adoção do Euro numa Europa infinitamente mais desenvolvida e organizada do que a América do Sul onde, mesmo assim, não conseguiu que a moeda fosse adotada em todo o território, visto que a Inglaterra não a utilizou e, adicionalmente, acabou abandonando o grupo.

O primeiro óbice para adotar a moeda comum seria a grande diferença da economia dos países. Brasil e Argentina, as duas maiores economias da área, teriam inicialmente como embargo a diferença da inflação – inferior a 5% no Brasil e superior a 100% ao ano na Argentina – e também diferente nos demais países. Isso sem falar de outras diversidades, como o tamanho do PIB (Produto Interno Bruto) de cada parceiro.

As cúpulas dos países sul-americanos – se continuarem ocorrendo – deveriam tratar de temas mais pontuais e de resolução imediata ou próxima como o comercio entre as nações do bloco, o controle de fronteiras, o combate ao crime organizado e a segurança do continente. Seria uma imprudência continuar com a conversa de moeda comum e de uniformização ideológica, seja ele para a esquerda ou para a direita. São teses irrealizáveis.

De volta a Brasília, se pudéssemos, gostaríamos de sugerir ao presidente que, em vez da busca de soluções internacionais, busque a governabilidade que – salvo melhor juízo – está cada dia mais frágil em seu grupo. Tome providências para manter o governo íntegro e jamais admitir sequer a possibilidade de ser refém tanto do Poder Legislativo quanto do Judiciário. Se isso ocorrer, poderá não conseguir terminar o mandato ou o fará sem o brilho almejado e – convenhamos – merecido por quem dedicou a vida inteira à política. Independente de gostar (ou não) da ação política de Lula e aliados, torcemos para que tudo dê certo. Será menos sofrido para a população.

As opiniões aqui publicadas não refletem necessariamente a opinião da Folha de Franca

Tenente Dirceu Cardoso Gonçalves

É dirigente da Aspomil (Associação de Assistência Social dos Policiais Militares de São Paulo).

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