Minhas corridas matinais 2 – O julgamento
Dia desses, durante minha corrida matinal, deparei-me com um rapaz que parecia estar andando com seu cachorro. O animalzinho estava solto, divertindo-se no terreno baldio, enquanto seu dono, com um pedaço de madeira nas mãos, empurrava restos de fezes de cachorro para perto de uma saída de esgoto.
Apesar de dirigir-lhe um bom dia bastante simpático, imediatamente abri minha caixa de julgamentos pré-definidos. No restante daquela subida não muito inclinada, condenei o rapaz de forma inconteste. Achei aquilo um absurdo! Como é que ele não tinha saído com sacolinhas de plástico em seu bolso, já preparado para recolher as fezes anunciadas, aquelas que todos os cães adoram deixar pelo caminho durante seus passeios?
Sozinho e ofegante no final da subida, decidi peremptoriamente que o rapaz era um folgado, pois saia de casa com o firme propósito de dividir publicamente as sujeiras de seu animal de estimação. E a sentença foi se agravando conforme eu avançava no caminho e em minhas convicções. Além de folgado, era também uma pessoa individualista, que só pensava em si mesmo, incapaz de recolher as fezes de seu cachorro para preservar a limpeza da rua.
E antes de chegar à esquina, ampliei a ainda mais a sentença. Comecei a olhar para todas as pessoas que passeavam com seus cães em busca de sacolinhas para a limpeza das fezes. Como não as via, fui condenando a todos, sem nenhuma clemência. Todos folgados e sem nenhuma preocupação com o social.
Mas, de repente, cheguei à esquina. Ah! As esquinas! Como são importantes as esquinas! A despeito de nossa percepção, elas são sempre uma possibilidade para escolhermos novos caminhos. E foi aí que comecei a pensar de outra maneira. Já saindo da subida e entrando em um terreno mais plano, abri espaço em minha mente para os argumentos de defesa do rapaz e seu cão.
Será que ele não poderia estar em frente a sua casa e nesse caso estaria empurrando para a sarjeta as fezes que outros deixaram na rua? Afinal, o cãozinho estava sem coleira, ele estava atravessando a rua de forma lateral, as fezes não estavam tão “fresquinhas” e talvez eu tenha visto um portão semiaberto. De repente, fiquei em dúvida. Ao mesmo tempo, me envergonhei por tê-lo condenado tão rapidamente.
Entre esses argumentos de defesa e acusação, percebi o quanto somos rápidos em julgar as pessoas. A todo o momento emitimos opiniões. Aquela pessoa é assim, aquilo que ela fez é um absurdo, é inacreditável como pode dizer isso ou aquilo e assim vamos decidindo quem é bom e quem é ruim, quem está certo e quem está errado.
E, geralmente, somos implacáveis. Julgamos sem averiguar o contexto, sem analisar as premissas. Simplesmente olhamos as pessoas dançando e as julgamos insanas. Só nos esquecemos de que às vezes somos nós que não estamos conseguindo ouvir a música.
Ótimo texto!