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A incerteza na eleição da Venezuela

Exceto os problemas e tragédias que cada país, região ou localidade vivem no dia-a-dia, o desfecho da eleição na Venezuela é uma grande preocupação. Tanto que os Estados Unidos, que já produziram inúmeras denúncias e bloqueios econômicos ao vizinho país, oferece anistia ao ditador Nicolás Maduro e a seus aliados em troca da saída deles e transição do poder para a oposição. O impasse está na declaração da reeleição de Maduro, emitida pela autoridade eleitoral venezuelana e da insistência dos oposicionistas quanto à vitória de Edmundo González Urrutia, segundo apurações paralelas. O complicador do presente é que a Suprema Corte venezuelana, a quem foram enviados os relatórios de votação, diz que dentro de alguns dias apresentará o resultado da auditoria que faz no material eleitoral e adverte que a decisão será “irrecorrivel”. Decisão irrecursável é o mesmo que ditadura.

Começamos a semana com a notícia de que os presidentes Lula (Brasil), Gustavo Petro (Colômbia) e Lopez Obrador (México) devem conversar pela videoconferência para decidirem se continuam dialogando com Maduro em busca da solução. Os três pediram inicialmente que os relatórios de votação fossem divulgados. Mas em vez de divulgar, Maduro os enviou à Justiça, cujos dirigentes são seus aliados, como os da autoridade eleitoral. O propósito é, com o conhecimento público do resultado das urnas, manter o concorrente que tiver comprovada a vitória, seja ele Maduro ou Urrutia. Há, também, a proposta para a divisão do poder, mas Maduro não aceita. Seria interessante os três presidentes esclarecerem qual o interesse que os move em relação à apuração da lisura da eleição na Venezuela e – mais que isso – se os seus países concordam ou não e o que pretendem fazer em relação à punição dos representantes diplomáticos dos países,amigos que o chavismo expulsou de Caracas por questionarem a eleição denunciada como fraudulenta.

O resultado divulgado da eleição – onde Maduro teria ganho por 51% – Não é reconhecido por Estados Unidos, União Européia e vários outros países da América Latina. No entanto, mesmo com essa rejeição internacional, o ditador resiste e – para preocupação geral – tem o apoio da China e da Russia. Teme-se o risco de, em os Estados Unidos ou outras nações empregando força para a derrubada da ditadura, os aliados chineses e russos entrem no conflito e o problema, que é regional, torne-se mundial e tenha conseqüências imprevisíveis. E Maduro sabe disso!

Para o Brasil, a crise eleitoral venezuelana é um problema, porque temos mais de 2 mil quilômetros de fronteiras com aquele país. Tanto que as Forças Armadas e demais órgãos de segurança já reforçaram suas posições e equipamentos na zona fronteiriça para evitar que o conflito acabe invadindo o território brasileiro.

A posição de Lula é delicada. Ele sempre apoiou a ditadura venezuelana – sob Hugo Chávez e Nicolás Maduro – quando no governo, manteve boas relações com aqueles governantes e agora, mesmo atacado por Maduro – no episódio do “banho de sangue”, preferiu acautelar-se e negociar. Tanto que enviou Celso Amorim para acompanhar a eleição e em vez de aceitar ou rejeitar o resultado divulgado, preferiu pedir a apresentação dos votos contados. Tivesse não reconhecido o resultado, certamente nossa diplomacia teria sido expulsa de Caracas, como já ocorreu com Argentina, Chile, Costa Rica, Peru, Panamá, República Dominicana e Uruguai. É de se esperar que o esforço não seja em vão.

As relações internacionais precisam funcionar eficientemente para evitar conflitos. Mas os países – inclusive o Brasil – não podem transigir diante de Maduro e admitir que continue no poder sem ter recebido a maioria dos votos. É necessário encontrar um meio que dê credibilidade e transparência à votação dos venezuelanos e o país seja governado por aquele que recebeu a maioria dos sufrágios. Seja ele Maduro ou Urrutia. Democracia pressupõe eleições limpas onde o mais votado assume, o derrotado se resigna e o povo sente-se representado. Guardá-la num país autônomo é tarefa conjunta do governo, da oposição e do eleitor. As nações amigas não deveriam se envolver, sob pena de incentivar e provocar a guerra civil (ou “banho de sangue”, como advertiu Maduro. Gostando ou não, os vizinhos não deveriam colocar o bico, em respeito à autodeterminação dos povos. Se o chavismo roubat e eleição, e o povo rebelar-se, resolvam eles o problema. Brasil, Colômbia, México e outros aliados e até os adversários do regime devem ficar fora da contenda.

Tenente Dirceu Cardoso Gonçalves

É dirigente da Aspomil (Associação de Assistência Social dos Policiais Militares de São Paulo).

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