O conservador que defende o progressista
O advogado Cristiano Zanin, indicado pelo presidente Lula à cadeira deixada por Ricardo Lewandowski no Supremo Tribunal Federal, é uma surpresa aos evangélicos, ruralistas e outros conservadores do Congresso Nacional. Ao apresentar-se para o tradicional beija-mão dos senadores que irão sabatiná-lo e votar na sua admissão (ou não) como membro da Suprema Corte, definiu-se como “católico, casado com a mesma esposa, pai de três filhos, e de família tradicional”. Sinalizou distanciamento das pressões da esquerda petista e aliada ao enfatizar que, na sua ótica, em pautas relevantes e de costumes, como aborto e drogas, a decisão deve ser dos parlamentares, não do Supremo, como tem ocorrido nesses tempos de alta judicialização das prerrogativas dos poderes da República.
Embora seja inquestionável a sua ligação com Lula – de cuja família é defensor há dez anos e a quem prestou eficientes serviços nos mais turbulentos tempos de sua carreira política e vida pessoal, retirando-o do cárcere rumo à reinvestidura no poder – o virtual ministro exibe a bandeira da independência ao ativismo esquerdista. Sabe que estará sob o crivo de 81 senadores, dos quais mais de 60 são de centro-direita. É a explicitação de uma postura que, por muitos exemplos conhecidos em nomeações anteriores, não constitui a garantia de que, depois de empossado, não mudará de idéia.
Uma das leituras sobre o advogado conservador que atua na defesa de um líder político progressista e de posturas muitas vezes discutíveis e até reprováveis, leva à constatação de que, mesmo nos grupos politicamente radicalizados há a necessidade da temperança de procedimentos para que os objetivos sejam alcançados. Zanin, ao buscar questões técnicas que pudessem libertar Lula dos tentáculos da Operação Lava Jato, cumpriu sua tarefa, mesmo com todos os questionamentos às decisões judiciais que conquistou.
Queira ou não, independente da postura que mantiver, o futuro ministro será sempre identificado como resultante da indicação do presidente Lula. Da mesma forma que o são os demais magistrados em relação aos governantes que os indicaram e, após o aval do Senado, os nomearam. O importante é que atue com a discrição e lisura de que carece a instituição e não perca o foco da razão da existência do seu posto e do próprio STF: a defesa e guarda da Constituição.
Os tribunais – descendo do STF até primeira instância – têm o dever básico de fazer cumprir o arcabouço legal e com ele modular as contendas da sociedade. Os magistrados nada devem de subordinação ou gratidão aos que os nomearam. A expectativa é que atuem rigorosamente dentro da lei e jamais atentem contra o ditame constitucional que define os poderes da República e os fazem independentes e harmônicos entre si (CF, art. 2º). Que a chegada de Zanin e de outros que virão em breve seja fator de avanço e equalização da mais alta cortte de Justiça do País com os interesses da sofrida população.
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