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O Parlamento e o respeito entre os Poderes

Finalmente, senadores e deputados resolveram assumir a parcela de Poder que a Constituição lhes reservou na tripartição institucional da Republica Federativa do Brasil. O Senado aprovou por 52 votos a 18 a PEC (Proposta de Emenda Constitucional) n• 8/2021, de iniciativa do senador Oriovisto Guimarães (Podemos-PR), que impede os ministros do STF (Supremo Tribunal Federal) de invalidar monocráticamente leis e atos do presidente da República e das mesas da Câmara dos Deputados e do Senado. Falta agora a votação dos deputados, que se movimentam para liquidar a matéria antes do recesso de fim-de-ano, que começa no dia 15 de dezembro.


A forte reação do Congresso Nacional levou o governo a suspender temporariamente a portaria publicada na segunda-feira, pelo Ministério do Trabalho, que restringia o trabalho aos finais de semana e feriados e colocava patrões e empregados sob a exigência de acordo de prorrogação de jornada celebrado pelos sindicatos. Com o recuo, justificado pelo ministro Luiz Marinho, como necessário para correções ao texto, voltam a valer as regras de flexibilização de jornada colocadas em vigor em 2021, pelo governo Bolsonaro.


Outro grito de independência dos congressistas está no aviso enviado ao Palácio do Planalto de que derrubarão eventuais vetos aplicados pelo presidente à prorrogação da desoneração da folha de pagamento aos 17 setores que mais empregam.


Enganam-se os que especulam ou procuram fazer crer que se trata de uma rebelião parlamentar. Ao contrário, é apenas o assumir da parcela de autoridade e responsabilidade institucional do Poder Legislativo para evitar que suas prerrogativas sejam usurpadas e exercidas indevidamente pelo Judiciário ou Executivo, como tem ocorrido frequentemente na vida política brasileira dos últimos anos.
Sabiamente, os constituintes – tanto os de 1987/88 quanto os anteriores, que elaboraram as Cartas Magnas da República, – estatuíram os Poderes da União como independentes e harmônicos entre si (artigo 2• – CF 1988). Não pode haver supremacia de um sobre os outros, mas paridade, cada qual na observância e cumprimento de suas atribuições.


A postura independente de Senado e Câmara poderá ser um grande bem para a estabilidade brasileira e a manutenção democrática. Contudo, deputados e senadores precisam exercer efetivamente a autoridade que o povo lhes concedeu através do voto. Evitar que suas atividades relacionadas ao Executivo possam ser classificadas como venda de votos parlamentares, não permitir que emendas parlamentares possam ser confundidas com negociata e não confrontar com os outros poderes, mantendo a linha de respeito e independência.


Urge que as casas legislativas não dêem espaço para terceiros interferirem em suas prerrogativas. Que elas próprias, através de suas comissões de ética, apurem e punam irregularidades cometidas por seus membros. Que encontre todos os meios de autocontrole, evitando as apurações e processos do STF em relação a parlamentares, que hoje somam mais de uma centena de feitos contra deputados e senadores.

O ideal, se ainda for possível, é voltar à situação onde o titular de mandato legislativo só podia ser processado mediante autorização de seus pares. Isso pode fazê-lo melhor representante da população, pois não temerá perseguições e represálias vindas de adversários, do Ministério Público ou até do Judiciário. Sempre que um deputado ou senador sofrer alguma denúncia, desde que não seja punido pela própria casa onde exerce o seu mandato, seu processo deverá permanecer inerte até que termine o seu seu período eletivo e ele possa ser processado como cidadão comum.


Somos defensores da tese de que os membros dos poderes – Legislativo, Executivo e Judiciário – têm de gozar de liberdade e imunidade para bem exercer sua missão. Não existem para o confronto e nem para invadir a seara pertencente aos outros dois poderes. O Legislativo deve legislar (fazer e votar leis); o Executivo governar e, como define a nomenclatura, executar o governo; e o Judiciário judicar, mediando as disputas da sociedade sem interferir nas atribuições do Legislativo e do Executivo. Não esquecer do requisito constitucional de independência e harmonia.


A Nação – constituída pelos 203 milhões de habitantes que formam nossa população – espera que os integrantes do Legislativo, Executivo e Judiciário sejam fiéis cumpridores das leis, cultivem suas prerrogativas e respeitem as dos demais. Só mais um detalhe: que os presidentes das casas legislativas abandonem de imediato o nefasto procedimento de engavetar os pedidos de impeachment. O da Câmara fazendo tramitar os pedidos de afastamento do presidente da República e o do Senado executando o mesmo em relação aos ministros do STF e ao PGR.

Toda petição protocolada no Parlamento têm de chegar a uma conclusão e, dependendo da conclusão da apuração dos fatos, resultar no afastamento da autoridade acusada ou, se o crime não restar comprovado, desaguar num relatório suficiente para que o denunciante seja processado – pelo próprio Legislativo, – por crime de denunciação caluniosa. E, ambas as casas não podem se furtar de apurar as falhas dos próprios membros. Só esses cuidados é que serão capazes de devolver o prestigio e representatividade das instituições e restituir a confiança da população. Requisitos do regime democrático…

Tenente Dirceu Cardoso Gonçalves

É dirigente da Aspomil (Associação de Assistência Social dos Policiais Militares de São Paulo).

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