A Autoridade Climática e a rapidez do fogo
O Estado de São Paulo prendeu, de 28 de agosto até o último final de semana, 22 indivíduos acusados de atear fogo na mata. Eles são investigados e serão processados e julgados por crime ambiental. Em nível nacional, a Polícia Federal tem 52 inquéritos abertos com a mesma finalidade.
A chuva que caiu na segunda-feira serviu para diminuir em mais de 80% os incêndios florestais no território paulista mas, mesmo assim, ainda haviam 11 municípios com focos ativos, que mobilizaram grande aparato de bombeiros e viaturas terrestres e aéreas de combate ao fogo.
Apesar da ajuda da chuva, continuam fechadas ao publico e assim permanecerão até o próximo dia 29 as 80 estações de conservação florestal do Estado. Esses parques, hortos e similares deveriam ter sido reabertos no dia 12 mas optou-se pela prorrogação do trabalho sem acesso da população por causa do quadro ainda grave dos incêndios e do perigo que representam. Segundo levantamento do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais), só nos dias de setembro já sofremos quase mil incêndios, com elevados prejuízos. Só nas lavouras de café, o fogo já eliminou 300 mil pés da planta.
O quadro é preocupante. O Estado mantém sua estrutura de salvamento em operação e os municípios se mobilizam para atender tanto a emergência do fogo quanto a falta de água, que ocorre pela seca prolongada e por aumento do consumo decorrente da lavagem da fuligem resultante da “chuva preta.
Além de consumir matas e propriedades rurais, o fogo também tem causado transtorno às cidades, tanto pelo avanço em áreas urbanas, interdição de rodovias e até a destruição de prédios escolares e outros equipamentos. Isso sem dizer da suspensão de aulas, do trabalho e do aumento dos problemas respiratórios provocados pela fumaça e outros resíduos dos incêndios, que elevam a demanda por atendimento de saúde.
No último dia 10, o presidente Lula anunciou, em Manaus, a criação da Autoridade Climática para “estabelecer as condições de ampliar e acelerar as políticas públicas a partir de um Plano Nacional de Enfrentamento aos Riscos Climáticos Extremos”. Apesar de ser algo destinado a engrossar o combate ao fogo que consome vastas áreas do território, o projeto ainda não foi remetido ao Congresso Nacional, que deverá discutir e votar a matéria. O agronegocio já manifestou o interesse de participar, e outros setores também. Preocupa-nos a possibilidade do novo órgão transformar-se em objeto de disputas políticas e isso retardar sua atividade. Nesse particular, a ação do ministro Flávio Dino, do Supremo Tribunal Federal, apesar de ser considerada por alguns como invasão do Judiciário às atribuições do Executivo e Legislativo, pode ser útil na medida em que desburocratiza verbas para o combate ao fogo e, principalmente, fixa prazo (15 dias) para o começo dos trabalhos em campo.
O combate ao fogo – salvo melhor juízo – deverá ser apenas uma das funções da Autoridade Climática e a de mais urgência nesse momento em que arde considerável parcela do território nacional, impondo inestimáveis danos ecológicos e econômicos e o sofrimento da população. Mas, essa autoridade tem muito mais a fazer, desde a proteção das pessoas e do patrimônio publico e privado até a criação e cultivo de normas protetoras aos danos causados pelas forças da Natureza e criação e/ou atualização de procedimentos tanto para o cidadão quanto para o governo e as corporações.
Uma das medidas protetoras dessa Autoridade precisa ser investida é a proteção dos mananciais hídricos onde buscamos a água que bebemos e a sanidade dos rios que, apesar dos esforços e legislação restritiva, ainda continuam recebendo grande quantidade de despejos de municípios que não cumprem o dever de tratar seus esgotos e – o pior – são impactados diuturnamente pelo esgoto lançado “in natura” por ocupações irregulares do solo que sequer existem nos mapas dos municípios onde estão localizadas. Não existem no papel mas sua lixívia cai diariamente na bacia hidrográfica.
A Autoridade Climática terá de ser forte e bem equipada para enfrentar os desafios. E, embora chegue na emergência do fogo, terá muito o que fazer na reconstrução do Rio Grande do Sul, impactado pelas águas que em maio devastaram grande número de suas cidades.
O ideal é que, sem maiores delongas, o governo envie o Projeto da Autoridade Climática e ele seja uma Medida Provisória para entrar em vigor imediatamente. Ou, na impossibilidade disso, pela magnitude do empreendimento, faça a MP pelo menos para tornar inafiançável o crime daqueles que ateiam fogo e eles sejam efetivamente punidos, começando por ficar encarcerado até o seu julgamento. É preciso encontrar um meio eficaz de detê-los.