Pandemia gera onda de cancelamentos de feiras agrícolas no país
MARCELO TOLEDO – Em alguns lugares elas foram canceladas, enquanto em outros sofreram adiamento. Há ainda quem decidiu realizar, mas apenas no ambiente virtual. Devido à pandemia do novo coronavírus, feiras e exposições agropecuárias que movimentam bilhões em negócios e estavam previstas para ocorrer no primeiro semestre foram afetadas em todo o país. Em alguns casos, o evento deixará de ser realizado pelo segundo ano consecutivo, já que a pandemia começou a inviabilizar aglomerações ainda nos primeiros meses do ano passado.
Mais de uma dezena de feiras já decidiram por mudanças em seu cronograma. Juntas, elas movimentaram em suas últimas edições mais de R$ 12 bilhões em negócios.
A Coopavel deixou de fazer a versão presencial da 33ª edição do Show Rural em Cascavel (PR), que ocorreria entre os dias 15 e 26 deste mês, em virtude do aumento de casos da doença na região e no estado.
Ela foi uma das últimas grandes feiras a ocorrer em 2020, na primeira semana de fevereiro. Movimentou R$ 2,5 bilhões em negócios e atraiu 298.910 visitantes.
Com a impossibilidade de público neste ano, a opção foi por uma feira digital. “A prioridade sempre deve ser a vida, por isso o Show Rural Coopavel entende que a melhor decisão é a de cancelar as visitas que seriam feitas na área, preservando assim a saúde de clientes, expositores, visitantes e colaboradores”, diz trecho do comunicado sobre a mudança no formato.
Já a Tecnoshow Comigo, em Rio Verde (GO), anunciou ainda em janeiro o cancelamento da edição deste ano devido à pandemia. Sua última edição, em 2019, movimentou R$ 3,4 bilhões em negócios e atraiu 118 mil visitantes. Prevista para abril, não vai ocorrer pela segunda vez seguida. “Foi preciso tomar esta decisão tão difícil, mas necessária, face ao cenário de incertezas que envolve a pandemia causada pelo coronavírus. Mesmo com o protocolo sanitário para a realização da feira já em discussão junto às autoridades de saúde, o momento ainda é de muita cautela e não seria prudente promover o evento”, diz trecho de comunicado assinado pelo presidente da Comigo, Antonio Chavaglia.
A edição de 2022 está marcada para ocorrer entre 4 e 8 de abril.
É o caso também da Norte Show, em Sinop (MT), que seria realizada em abril e foi adiada para 19 a 22 de abril do ano que vem. Organizada pela Acrinorte e Sindicato Rural de Sinop desde 2018 para alavancar negócios no norte de Mato Grosso, ela reuniu em 2019, em sua última edição, 32 mil pessoas, com negócios que atingiram R$ 1 bilhão.
No Nordeste, a Bahia Farm Show, que seria de 25 a 29 de maio em Luís Eduardo Magalhães, no oeste baiano, transferiu sua 16ª edição para o ano que vem. A previsão é que ocorra de 31 de maio a 4 de junho, conforme comunicado assinado pelo presidente da feira, Odacil Ranzi.
Em 2019, alcançou R$ 1,91 bilhão em volume de negócios e recebeu 68 mil pessoas. Devido à pandemia, ela já não foi realizada no ano passado.
No Sul do país, a Expodireto, organizada pela Cotrijal em Não-Me-Toque (RS), que ocorreria na semana passada, foi cancelada ainda em janeiro como precaução sanitária. Ao contrário de outros eventos, o cancelamento foi integral, incluindo o formato digital. “Mesmo com o protocolo de saúde já aprovado junto ao comitê do governo do estado, optamos pela maior prudência possível. A Cotrijal levou em consideração o momento de incerteza quanto ao estágio da pandemia”, diz comunicado assinado pelo presidente da cooperativa, Nei César Manica.
Mas há quem planeje fazer um evento presencial, ao menos em partes, com limitação de público. É o caso da tradicional Expozebu, em Uberaba (MG), que cancelou a exposição em 2020, mas manteve a edição deste ano, a 86ª. Ela chegou a ser lançada em março de 2020 e tinha o objetivo de reunir 300 mil pessoas e gerar R$ 250 milhões em faturamento, conforme a ABCZ (Associação Brasileira dos Criadores de Zebu), mas teve de cancelar devido à pandemia.
Agora, a intenção é limitar o Parque Fernando Costa, que sedia o evento, a 1.300 pessoas por dia entre 1 e 9 de maio, segundo o presidente da ABCZ, Rivaldo Machado Borges Junior. “Hoje seria impossível, o Brasil está passando por uma fase crítica. Mas nossa expectativa, como vimos em outros países, é que até lá a pandemia estará decrescendo, vai ter um maior controle. Um shopping com ar condicionado ligado tem mais gente do que isso”, disse. O parque tem uma área de 180 mil metros quadrados e, de acordo com ele, seria possível colocar até 5.200 pessoas com distanciamento no local.
O controle sanitário inclui a apresentação de testes negativos para Covid-19 e cuidados com desinfecção e higienização. “Se a pessoa não tiver exame, ela poderá fazer num trailer que instalaremos aqui.”
Além do público restrito, a feira será virtual por meio de um canal no Youtube -estúdios foram montados e equipamentos, comprados.
A expectativa de Borges Junior é que o faturamento por animal seja 50% superior aos valores praticados na última edição, em 2019. O faturamento global da feira, porém, não é possível prever, já que não haverá estandes montados nem shows.
“Apesar de tudo estamos otimistas, não podemos ficar de braços cruzados. Na crise, a gente cria, não podemos é parar. Estamos vendo muitas feiras fechando, não acontecendo, o cara tinha de ter criatividade e fazer alguma coisa.”
Realizar um evento híbrido, presencial com público restrito e virtual, é o que defende também Francisco Matturro, presidente da Agrishow (Feira Internacional de Tecnologia Agrícola em Ação), que não aconteceu em 2020 em Ribeirão Preto (SP) e está marcada para 21 a 25 de junho. A data, definida ainda no ano passado, já representa um adiamento em relação ao período em que tradicionalmente ocorre, entre a última semana de abril e a primeira de maio.
A realização ou não neste ano deve ser definida na próxima semana. “Defendo que seja presencial e virtual, outro formato não vejo. Só virtual é muito difícil e só presencial é impossível hoje”, afirmou.
Matturro admite que a decisão será tomada com o ambiente de hoje, marcado por recordes de internações e óbitos no país. “É uma tragédia.” O formato virtual, conforme ele, provoca a perda de relacionamentos entre os envolvidos nas negociações. “O olho no olho, aquele cafezinho, onde muitas coisas acontecem.”
Outras feiras, como a Femagri, em Guaxupé, e a Feira do Cerrado, em Monte Carmelo, ambas em Minas Gerais, foram organizadas neste ano apenas no formato virtual.