Velha é a injustiça
Quanto menos se conhece alguém, mais corremos o risco de construir a sua imagem de maneira distorcida, aumentando-a ou diminuindo-a.
É com esta proverbial sentença de Carl Jung, que nos deixou nos anos 1961, o médico e pensador suíço e pai da psicologia analítica, que abrimos nossa reflexão, que se almeja minimamente histórica, sobre a criação da Décima Terceira Subseção da Ordem dos Advogados do Brasil, uma das subseções da Secção de São Paulo.
No pensamento das pessoas, o Direito é algo direto, ou deveria ser, a significar o que está conforme a regra.
Assim também fica muito solto, abrangente ao nível do inalcançável.
As civilizações, capazes de cometer crimes de guerra, na cara de organismos internacionais e de seus tratados e escuramente suntuosos tribunais, no poente do primeiro quarto do século XXI, resolveu que por Direito se compreende um conjunto de regras obrigatórias que garantem a convivência social e que regulam a conduta do homem na sociedade.
Aplausos.
Descoberto no início de 1.500, do ano do Senhor, notarialmente, anotamos que o Brasil se deu o trabalho de se tornar independente das tantas Ordenações de seu colonizador favorito, engravidando sua intelectualidade e pondo a gestar alguma academia jurídica em um ritmo de assustar o gente boa e internacionalmente famoso ex-piloto de Fórmula 1 Rubens Barrichello, trezentos e vinte e sete anos depois.
Não me venham lembrar do Dia da Pendura! O calote da classe, mesmo em formação, nas faculdades ainda, é nada abonador, embora jocoso e gostoso, de um lado, e danoso ao comerciante, do outro lado do balcão. Deus lhes pague! Nem isso os estudantes de Direito esboçavam. Raça fria, desde o ventre.
Era 11 de agosto. Lei aprovada pela Assembleia Geral Legislativa, sancionada pelo Imperador D. Pedro I, de 1827, instituiu a comemoração do Dia da Criação dos Cursos Jurídicos no Brasil.
Nesse particular, estamos a saber com quem os legisladores federais, estaduais e municipais aprenderam que suas atribuições fiscalizatórias do Executivo vêm muito depois das denominações de vias, próprios e logradouros públicos, solenidades cansativas de homenagens para tudo quanto é coisa e a criação de dias para tudo.
Para ganhar foros de realidade, realmente, essa lei imperial criou os dois primeiros cursos de ciências jurídicas e sociais do Brasil. Em terras paulistanas, a Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo; e, às margens paradisíacas do mar que circunda a Recife antiga, ali grudada nela, em Olinda, a Faculdade de Direito de Olinda, atual Faculdade de Direito da Universidade de Pernambuco.
A advocacia não mereceu nenhum tratamento legislativo. A lei a olvidou. Ensurdecida se nos fez.
Pão não demanda serviços de padeiro; prédios se erguem sem pedreiros; textos se compõem do nada; o escritor é dispensável. Direito se concretiza dispensando o ministério do advogado. Os capachos do Rei e Imperador ignoraram a atividade profissional do causídico, outorgando-se a difícil missão legislativa de distinguir bacharéis formados daqueles que, defendendo uma tese, receberiam o grau de doutor em nossas ciências jurídicas.
Provavelmente, se tivessem feito um copiar/colar do mundo das teclas da virtualidade, com os recursos adaptados de então, do que se fez e aplicava na que é havida como a universidade mais antiga de todo o continente europeu, a Universidade de Bolonha, que introduziu em sua grade o Curso de Direito no ano de 1150, alguma imitação, grotesca que fosse, poderiam ter salvado a nossa pele bem antes.
Brasileiro não desiste nunca. Perdão por usar a expressão pela primeira vez. É que o faço para narrar que a mãe da Ordem dos Advogados Brasil, fundada em 1931, é um pai. A concepção por aqui foi extraordinária porque o genitor se constituía no IAB – Instituto dos Advogados do Brasil, criado em 07 de agosto de 1843.
Bate-nos, nessa quadra, uma dúvida cruel: seria coincidência que as origens da OAB se entrelaçam com o movimento que resultou na Independência do Brasil, no Governo Provisório de Vargas?
Alguém precisava honrar a pátria. Os paulistas foram os primeiros a acusar Getúlio de ser ditador. Prenunciando o Mito Capitão, pegaram em armas, em 1932, para exigir uma nova Constituição para o Brasil. Deram tiro para todo lado; erraram os alvos, graças a Deus. Apesar da derrota para as tropas federais, conseguiram o que queriam, uma Nova Constituição, que trazia algumas conquistas relevantes, como o voto feminino, o voto secreto e as primeiras leis trabalhistas.
Seja lá como for, quem não tem pecados atire a primeira pedra!
O povo brasileiro tinha que ter voz. Seus representantes políticos negavam fogo; como negam nos tempos hodiernos.
A Ordem dos Advogados do Brasil, mesmo tendo perdido o trem das onze, firmou-se como instituição essencial para a garantia e realização dos valores albergados pelos conceitos de República e de Estado Democrático de Direito.
Entre um deslize e outro, um conchavo aqui e outro ali, fazendo vistas grossas aos malfeitos de aliados noturnos e de frias madrugadas na boêmia das capitais, pouco se ruborizando com as tendências ideológicas dos parceiros de bastidores, sobreviveu feito entidade credora da Nação brasileira, pelos nobres trabalhos de defesa da sociedade contra o autoritarismo e abuso de poder.
Tem sido assim. E assim seja.
A importância do estado falou alto. Não tardou e a Seccional de São Paulo, a que tudo indica, no prédio da Rua São Bento, n.º 19, 1.º andar, com as águas de março, abriu as suas comportas e, exemplarmente, em 1932, abdicou-se de tanto poder de classe e se dividiu em várias Subseções.
A décima terceira a ser reconhecida como Subseção é a de nossa cidade de Franca, na orgulhosa companhia da própria Capital, São Paulo, e das de Santos, Campinas, Rio Claro, Araraquara, Jaboticabal, Bebedouro, Piracicaba, Pirassununga, Amparo, Espírito Santo do Pinhal. Ribeirão Preto e São José do Rio Pardo, citamos.
No ano de sua fundação, a Subseção de Franca foi dirigida por Affonso Infante Vieira Filho. E pelo voto, em 1933, ficou assim e indelevelmente composta a sua primeira Diretoria: Presidente: Antônio Pinheiro de Lacerda; Vice-Presidente: Frederico José Marques; Secretário: Romeu Amaral; Tesoureiro: Affonso Infante Vieira Filho, o que reclamou destaque fora dessas divisas, em 28 de dezembro de 1934, nas páginas do jornal Correio Paulistano.
Esses pioneiros da advocacia continuam vivos em nossas memórias e cotidiano, a denominar ruas, escolas e outros espaços da cidadania local e regional.
Anais que se prezem a Décima Terceira Subseção da OAB-SP não tem. Uma pena, e uma lástima. O desprezo pela história a nós afeta desde sempre.
A lei da inércia nos trouxe até aqui, quando nossa Casa da Advocacia, que se deveria chamar Palácio da Cidadania, completa os seus Noventa Anos.
Para o azar de poucos e prazer e gosto de muitos, e dentre estes últimos nos incluímos, a brisa que refrescava a indolência daqueles tantos vem se transformando em ventos alísios, mexendo com os brios dos que devem agir pela preservação da realidade temporal do nosso constitucionalizado ofício – o único, por sinal – mormente nos últimos mandatos dos dirigentes locais.
Por falta de museu, temos que nos contentar com galeria de fotos (e não de fatos) da história da advocacia francana.
Rechonchuda, ganhou bastante peso político, social e, indissociavelmente, nas relações com os poderes constituídos, maiormente no trato com o Judiciário. Afinal, a OAB de Franca é uma senhora, de todo elegante, que não pode perder a pose. Veio e existe para isso, em nome do Direito e dos cidadãos, e dos que sequer atingiram, ainda, esse humano estado de reconhecimento de pessoa dotada de garantias individuais inegociáveis.
Está lúcida, cônscia de seu papel na sociedade de Franca e de toda essa vastíssima região. Fala, age, reage e interage com os planos e sonhos de Matusalém.
Esforçou-se para parar de depender das dependências dos outros, qual se dava naquele cômodo, com duas divisões, do piso superior ao prédio do antigo Fórum Estadual, vizinho do Elevado Dona Quita. Foi um árduo trabalho iniciado pelo inteligente e competente colega Dr. Luiz Eduardo de Freitas Vilhena, presidente naquele ano de 1986. A nossa sede própria saiu da planta.
Em 1989, cortou-se a fita e descerrou-se a placa de inauguração da Casa do Advogado.
Nas palavras do renomado decano causídico e seu ex-presidente, Dr. Carlos Roberto Faleiros Diniz, a Subseção está para a Advocacia, assim como o Município está para a Federação. Consiste na célula primária de organização da Ordem dos Advogados do Brasil, dando cumprimento às suas finalidades.
Os seus objetivos são atingidos, apesar dos desafios imprevisíveis do mundo atual, na dinâmica e sinergia dos fatos, pelo denodo com que cada presidente e sua diretoria comparece diante da classe e da comunidade, em sua pluralidade e rica convivência.
Para a nossa segurança e esperança de atingimento de nossas funções de profissionais indispensáveis à distribuição e à mais efetiva entrega de justiça, acabamos de ver eleito, longe de qualquer oposição, para o mandato que se estende a 2024, o Professor Doutor Acir de Matos Gomes, senhor de uma formação moral, cristã e acadêmica sabidamente invejável.
De cara, tem posto a cara em todos os assuntos e temas de que a Advocacia não pode fugir ou que finge não estar vendo. Pode-se vê-lo, sozinho ou com sua Diretoria e membros das Comissões, nos gabinetes de juízes, promotores de justiça e de procuradores de justiça, prefeitos, vereadores, deputados, delegados de polícia e de outros delegatários de serviços essencialmente públicos, de entidades civis e de classes e religiosas, nos esportes, nas universidades em que leciona ou preleciona, dentre outros ambientes e repartições em que as atividades privativas da Advocacia são indeclináveis e impostergáveis.
É aqui na Subseção Nonagenária que, na qualidade de defensora da Constituição, o apagar das velinhas não dá bolo na combativa militância dos advogados e das advogadas de Franca, tendo à sua frente o comandante Dr. Acir, na interminável missão de asseguramento da ordem jurídica da democratização do direito, dos direitos humanos, da justiça social, que devem atingidos pela boa aplicação das leis, rápida administração da justiça e pelo aperfeiçoamento da cultura e das instituições jurídicas, conquanto em clima de polarizações e radicalizações partidárias de ocasiões, com destinatários privilegiados mantidos a dano da coletividade.
Acreditamos na sua competência e na sua capacidade de representação dos profissionais da advocacia, cujas liberdades e prerrogativas são intocáveis pelo só fato de que os titulares dos direitos e interesses confiados ao seu patrocínio não são seus, mas dos clientes, dos jurisdicionados, do cidadão.
Noventa anos! A décima terceira filha da OAB estadual está de parabéns.