Alexandre Ferreira ataca direitos de servidores, que reagem através de sua organização
Na terça-feira (28) da última semana de janeiro, servidores públicos da prefeitura e membros do Sindicato dos Servidores e Empregados Públicos Municipais de Franca (SindServ), ocuparam a Câmara Municipal em um protesto organizado contra os ataques do prefeito Alexandre Ferreira (Solidariedade).
A mobilização, levada adiante pelo grupo União dos Servidores, liderada por figuras como Samuel Gomide, advogado e motorista do Samu, tinha como objetivo conquistar apoio por parte de outras categorias de trabalhadores e dos parlamentares da Câmara contra a tentativa da administração de Alexandre de alterar a carga horária dos servidores municipais, passando por cima de acordos coletivos.
Além do aumento da carga horária, Alexandre ataca os servidores com sua proposta de redução das folgas disponíveis durante o mês e desenvolver um mecanismo que limita os dias disponíveis para descanso dos servidores, e propõe uma que os trabalhadores do setor afetado tenham uma troca de turnos que ocorre a 1h da manhã, horário em que não existe circulação de transporte coletivo. O principal interesse apresentado por parte da categoria é da manutenção da escala de 40 horas semanais, 12×36. Apesar disso, a direção do SindServ, atropelando resoluções tiradas na assembleia pelos servidores, buscou abrir uma contra-ofensiva em meio a uma situação defensiva, propondo a escala 6×18.
Os servidores que serão afetados por essas medidas no caso de sua aprovação por parte da administração serão os trabalhadores do setor de emergência, respectivamente o Samu, prontos-socorros UPAs e (Unidades de Pronto Atendimento).
O ataque de Alexandre Ferreira contra os servidores não é uma novidade. Sua política, de cortar na carne dos trabalhadores, é a essa altura do campeonato uma marca registrada. O histórico de greves do funcionalismo público municipal sob a chefia de Alexandre data desde seu primeiro mandato.
A manifestação na Câmara, que reuniu cerca de 70 servidores, motivada pelo ataque contra uma das categorias que mais enfrenta dificuldades no mundo do trabalho me chamou a atenção. Por isso, busquei contato com Samuel Gomide, para me colocar a disposição da União dos Servidores na luta para impulsionar a mobilização e chamar atenção para a causa pela qual agora todos os servidores deveriam estar lutando: a proteção das suas condições de trabalho.
As longas horas de trabalho, muitas vezes em turnos ininterruptos, levam à fadiga física e mental, comprometendo a qualidade do atendimento e a saúde dos próprios profissionais, situação muitas vezes desconsiderada pela população, que faz com que seja importante o diálogo entre as entidades representantes dos servidores da saúde e da população.
A alta demanda por serviços de emergência, especialmente em regiões como Franca, que tem uma defasagem significativa na infraestrutura de saúde, resulta em uma carga excessiva de trabalho, com poucos recursos humanos e materiais disponíveis. O que destaca a relevância disso são os surtos sazonais de dengue e gripe.
A falta de equipamentos adequados, insumos médicos e infraestrutura física adequada dificulta o desempenho das atividades e aumenta o estresse no ambiente de trabalho. Profissionais de emergência estão constantemente expostos a situações de risco, como acidentes, violência urbana e doenças infectocontagiosas, além de lidar com cenas traumáticas e pacientes em estado crítico, o que pode gerar impactos psicológicos profundos.
Além de tudo isso, a desvalorização salarial e a falta de reconhecimento por parte do Estado contribuem para a insatisfação e o desânimo desses trabalhadores. Estamos falando de uma categoria que precisa lidar com a dor, o sofrimento e a morte de pacientes, além da cobrança por resultados rápidos e eficientes, gera um alto nível de estresse e ansiedade.
A combinação de todos esses fatores pode levar à síndrome de burnout, caracterizada por esgotamento físico e emocional. E como se não bastasse, a prefeitura busca flagelar ainda mais a classe com seus ataques.
Após obter contato com Gomide, pedi para que ele me concedesse uma entrevista, que será agora reproduzida de forma exclusiva, pois a política de intimidação e ameaça por parte da administração que será aqui expostas, a inação da direção do sindicato que agrava a desmobilização e desmoralização da categoria perante os ataques de Alexandre Ferreira precisam ser reconhecidos pela sociedade e pela categoria, para que as condições de enfrentamento dos servidores tenham um alcance ainda maior:
J.S.: Samuel, é um prazer estar falando com você. Samuel, quando começaram esses ataques da prefeitura contra os servidores da saúde?
Samuel G.: Na verdade, esse ataque teve início com o acordo feito com a Guarda Civil Municipal. Durante as reuniões que a prefeitura realizava com os servidores, chegou a ser mencionada a possibilidade de reduzir as folgas dos profissionais da saúde também. A prefeitura enviou essa proposta, e o sindicato já havia feito uma proposta depois das eleições, no ano passado, pois o acordo vigente venceria em dezembro de 2024. Ocorreu logo depois das eleições e antes da reforma administrativa que o prefeito estava organizando. Por conta disso, o prefeito solicitou um prazo para analisar a proposta do sindicato somente após a conclusão da reforma administrativa, que estava em andamento logo após sua posse.
A proposta foi apresentada pela prefeitura no meio de dezembro, com um prazo bastante reduzido para que o sindicato pudesse responder e apresentar uma contraproposta, tendo em vista o vencimento do acordo no final do mês. Essa situação gerou pressão e dificuldades para a negociação, já que o tempo para análise e discussão foi limitado.
Além do tempo limitado com a chegada da devolutiva por parte da prefeitura próximo do fim do prazo das negociações, o presidente do sindicato, Fernando, marcou as reuniões em cima da hora, dificultando a organização da categoria para formular sua proposta de acordo. E os avisos enviados não eram suficientes para alcançar todos os servidores. Eles simplesmente eram enviados para um grupo de servidores, postados lá e compartilhados no WhatsApp e no Facebook dele. Era uma notificação protocolar. Assim, as pessoas não ficavam sabendo. A maioria dos servidores só tomava conhecimento da reunião em cima da hora.
Mesmo assim, nesta primeira assembleia, em dezembro, conseguimos reunir uma quantidade significativa de servidores, inclusive mais do que o sindicato costuma juntar no dissídio. Através de uma mobilização do nosso grupo, União dos Servidores, conseguimos levar muitos servidores para essa assembleia.
J.S.: E o que aconteceu nessa primeira assembleia, em dezembro?
Samuel G.: Nessa assembleia, foi escolhida uma comissão, mas ele [Fernando] não respeitou essa comissão. A comissão foi formada para ajudar na negociação e transmitir de forma mais clara os trâmites para toda a categoria, tendo em vista que a comunicação do Fernando estava deixando muita gente em dúvida ou por fora.
Na primeira reunião com a prefeitura, por exemplo, após a formação da comissão, que inclusive foi realizada com o Petersson como representante da administração do Alexandre, eu fazia parte da comissão, mas ele [Fernando] não me avisou. Me avisou de última hora. Eu estava de serviço, porque trabalho no SAMU, tive que trocar uma folga e ir de uniforme para a reunião. Nessa reunião, o Fernando falou muito pouco, não estava preparado para ela. Da comissão, apenas eu fui, porque me avisaram em cima da hora.
J.S.: E como foi o contato da comissão e da direção do sindicato com o Alexandre durante a negociação?
Samuel G.: O Alexandre sempre coloca o Petersson na frente para negociar, ele nunca entra nas negociações, pelo que eu ouvi das negociações anteriores.
J.S.: Você havia comentado que o tom da administração era de ameaça. Pode elaborar?
Samuel G.: O Petersson já colocou de início que, se não houvesse alterações, colocaria o 6×18 para todo mundo. Foi isso que ele disse. E o Fernando, não sei como, ficou sabendo que, na verdade, o 6×18 seria numa escala diferente… Não seria o 6×18 que a prefeitura inteira, a saúde, a emergência toda trabalha, seria um 6×18 piorado.
Então, com base nisso, o acordo não pode ser considerado um acordo. Primeiro, porque a concessão é unicamente do trabalhador, não existe nenhuma contrapartida da prefeitura. E no final, há uma ameaça: se não aceitarem, vão colocar um horário horrível e inexequível, que é muito difícil de ser implementado.
Na possibilidade de isso acontecer, sabemos que a prefeitura já enfrenta uma grande dificuldade em montar essas escalas, o que vai prejudicar a vida dos trabalhadores, pois estamos há 13 anos nessa escala. São 13 anos nessa situação. E as pessoas têm família, têm segundo emprego — e é muito comum na saúde o pessoal ter um segundo emprego.
Essa questão foi levantada na reunião. Depois disso, foi solicitada uma contraproposta.
A direção, ignorando a comissão, elabora uma contraproposta sozinho descabida, pedindo menos horas numa situação em que a prefeitura quer aumentar as horas de trabalho. Isso foi um tiro no pé, um aventureirismo que deu carta branca para a prefeitura recusar a contraproposta dele. E temos que manter em mente que caso não houvesse acordo, o Alexandre pretendia prejudicar a gente mais ainda. Tudo o que aconteceu na assembleia, nas reuniões de negociação e nas dificuldades da direção do sindicato de trabalhar com a base e com a comissão vai culminar naquela mobilização que realizamos na Câmara dos Vereadores. É uma busca de apoio atrasada. Por conta da situação gerada pela direção, começamos a nos mobilizar com grande atraso.
J.S.: Você acha que a forma como a direção do sindicato conduziu isso atrapalhou a categoria? Como resolver isso?
Samuel G.: O sindicato há muito tempo não se mobiliza. Não se mobiliza para nada. Vários servidores estão perdendo direitos.
Ou eles [servidores] atuam de maneira isolada, sem o sindicato, que só trabalha de forma protocolar, participando das reuniões com a prefeitura. Mas, para atuar, para pensar em ideias, propor soluções, o sindicato não tem tido uma direção efetiva. Já tivemos redução de direitos com o pessoal da merenda, temos os ajudantes gerais, a guarda civil, que sofreu imensamente, sem nenhum apoio do sindicato. E agora, é a vez do pessoal da saúde.
Na verdade, quando a direção soube, lá atrás, que os direitos dos servidores da saúde seriam atacados, ele deveria ter se mobilizado, conversado com os servidores, falado sobre a possibilidade e começado a se reunir, informando que os direitos poderiam ser afetados. Ele deveria ter começado a mobilizar a partir daí, conversando com os servidores.
Hoje, o sindicato virou um grupo social. Ele só faz festas e convênios, mas não tem atuação. Ele deveria ter mobilizado os servidores.
Quando a proposta chegou, o sindicato deveria ter montado e organizado uma comissão, conversado mais vezes com os servidores, buscado o servidor. É difícil para o servidor do sindicato, ele entende isso, mas sem nenhuma atuação, sem ação alguma, é aí que eles não se envolvem. E depois tem gente que reclama que o servidor só aparece na hora do aperto. É óbvio que é só na hora do aperto, vai aparecer para quê? Sem ser chamado?
Geralmente, o servidor está alheio, por quê? Porque o sindicato não tem mobilização nenhuma.
J.S.: Agora, voltando um pouco à questão do ato que vocês fizeram na Câmara, como foi? Foi organizado ativamente por vocês? A direção participou da organização?
Samuel G.: Não, foi organizado apenas por nós [oposição]. Nós convocamos. Eu, junto com o nosso grupo, União dos Servidores, organizamos esse movimento.
J.S.: E quantas pessoas vocês conseguiram levar? Como foi a recepção dos vereadores?
Samuel G.: Levamos cerca de 70 pessoas, e a recepção foi positiva. Utilizei o plenário, os vereadores foram bastante receptivos, levantou o ânimo da categoria.
J.S.: Samuel, para finalizarmos, o que você acha que vai acontecer caso os servidores sejam derrotados nessa batalha?
Samuel G.: Se a gente perder esse direito, vamos ser mais uma vez desmobilizados. Porque, como fomos colocados em uma situação de divisão, vai parecer que vão atacar o direito de um e não o do outro. E esse “outro” será responsável pela queda do direito de um, o que vai ser muito desmobilizante.
Vai perder força, e, se acontecer algo assim, a nossa ideia continua sendo a mesma desde o começo: mobilizar, conversar com os servidores e nos preparar para o próximo ataque, que vai vir, que já está vindo. O caminho da terceirização…
Esses ataques têm um objetivo.
O objetivo é o enfraquecimento, e isso vai acontecer. O enfraquecimento da classe e o caminho da terceirização, que está corroendo toda a prefeitura.
J.S.: Muito obrigado pela entrevista!
Após a entrevista, que ocorreu no dia 29/01, quarta-feira, houve uma assembleia no Sindicato dos Servidores, para discutir mais uma vez a proposta da prefeitura.
Samuel me convidou para participar como observador e cobrir a atividade. A assembleia foi, do ponto de vista classista, um absoluto sucesso. Não me lembro da última assembleia sindical que vi em Franca com um clima de combatividade tão enérgico, com uma categoria tão consciente de seu desejo e tão decidida em agir para que ele se torne concreto. A direção teve dificuldade para falar o tempo todo, tamanha exaltação dos servidores por toda a sala. Eram salvas de palmas, palavras de ordem entoadas por grandes grupos de servidores, gritos de “não, não, não!” recusando o acordo proposto pela prefeitura que aumenta a carga horária dos servidores. Por fim, a resolução aprovada em assembleia foi de que os servidores recusavam a proposta da prefeitura, mas muito mais que isso: recusavam qualquer forma de ataque aos seus direitos.
Mediante os eventos políticos nacionais e internacionais, a desilusão e o descrédito para com os sindicatos pode facilmente surgir no seio da classe trabalhadora. O fenômeno de traição dos sindicatos, tomados por direções pelegas em todas as categorias, não deve ser uma justificativa para seu abandono. O problema não é o sindicato, mas sim da burocracia sindical. Assim como faz busca fazer a União dos Servidores de Samuel Gomide, Dougras, Eveline, Marcelino e demais servidores, todas as categorias devem estabelecer sólidas oposições, apoiadas nas bases, para enfrentar o processo que transforma seu principal aliado na luta por direitos, o sindicato, em enfeites do regime político degenerado.
Leon Trótski, um dos principais teóricos e líderes da Revolução Russa, assim como um dos mais habilidosos e experimentados defensores da classe operária internacional, abordou amplamente a questão da burocratização dos sindicatos e das organizações de trabalhadores, especialmente no contexto da decadência do capitalismo. Podemos encontrar muitas respostas para problemas de hoje em seus textos profundamente atuais.
De acordo com Trótski, a burocratização dos sindicatos surge, dentre outras, como uma consequência do distanciamento das massas e do controle por uma elite administrativa, em vez de serem governados pela base. Ele via os sindicatos como organizações fundamentais para a luta dos trabalhadores, não apenas como instrumentos de negociação de condições de trabalho, mas como pilares da revolução socialista. Contudo, com o tempo, muitos sindicatos, em vez de se tornarem organizações de mobilização e de luta contínua, passaram a ser geridos por uma burocracia que se distanciou dos interesses reais da classe trabalhadora.
Trótski argumentava que a burocratização dos sindicatos não era um problema meramente administrativo ou de gestão, mas uma questão política profunda. Os burocratas, ao buscarem estabilizar suas próprias posições e privilégios, muitas vezes se tornavam complacentes com as estruturas de poder existentes, evitando confrontos mais radicais e preferindo a negociação e a manutenção da ordem social do que a luta por transformações profundas. Os burocratas vêem os sindicatos como uma plataforma para acumular poder, ao invés de uma ferramenta de luta de classes. Como resultado, os sindicatos perdiam sua capacidade de mobilizar e organizar os trabalhadores de forma eficaz, tornando-se mais passivos e imunes à ação das massas.
A elaboração de Trótski, no entanto, não via a solução para a burocratização como a dissolução ou abandono dos sindicatos. Ele acreditava que os sindicatos deveriam ser preservados e democratizados, expulsando a burocracia de suas direções. A solução, portanto, era uma renovação radical do movimento sindical, baseada no retorno à democracia interna, à participação ativa das bases e à renovação das direções. Trótski defendia que a classe trabalhadora, através de uma luta constante dentro dos sindicatos, deveria retomar o controle das suas próprias organizações, enfrentando os burocratas e impedindo que estes se tornassem agentes de colaboração com o capital ou com o Estado. Para Trótski, essa luta interna nos sindicatos era crucial para a construção de uma vanguarda revolucionária e para a retomada do movimento como um todo. Para Trótski, a burocratização é uma ameaça ao potencial revolucionário dos sindicatos, mas também acreditava que a solução não estava em abandonar ou destruir os sindicatos, e sim em lutar por sua democratização e revitalização, expulsando a burocracia de sua direção e restaurando o poder nas mãos dos trabalhadores. A transformação do movimento sindical seria, assim, parte da luta contínua pela revolução socialista, que é o único processo de garantir permanentemente o direito dos trabalhadores.