Ressaca

Por Soraia Veloso
Vocês já se recuperaram da vitória da Fernanda Torres no Globo de Ouro? Eu não. Comemoro todos os dias. No domingo da vitória pensei em abrir a cidra que tinha na geladeira (sobra do Ano Novo) porque eu e meu filho gritamos como se fossemos da família Torres ou da família Paiva, enquanto meu marido deixava umas lágrimas furtivas rolarem. Ao ver outros vídeos com pessoas gritando e comemorando como nós, senti que verdadeiramente estávamos em uma Copa do Mundo. Nossa querida Pikachu disse que não deveríamos levar para o pessoal, que qualquer indicação de um filme em português já era uma grande vitória. Mas como não torcer, não acreditar até o fim que poderia dar certo? Como não levar para o pessoal a “derrota” de sua mãe 25 anos atrás? Gritei, gritamos; comemorei, comemoramos. Ficamos felizes.
Mas antes do grito, do aplauso, das lágrimas, veio o silêncio. Assisti ao filme em família tão logo foi lançado e enquanto muitos saiam ao final chorando, fiquei em silêncio, com um nó na garganta. De alguma forma a lágrima não veio, e muito sóbria, falei para meu filho, ‘acho que não vai dar, o filme é excelente, a história da família Paiva que é a história de outras famílias marcadas pela ditatura, não vai atingir os gringos americanos. Eles não vão nos dar o Oscar novamente’. Por que achei isso? Não apenas porque “Central do Brasil” foi preterido no Oscar (apesar do Globo de Ouro) ou porque Fernanda Montenegro não levou o de melhor atriz, mas porque o mundo prefere fingir que não há passado, ‘deixa pra lá, pra que mexer nisso agora?’. Mas pessoas desapareceram. Morreram. Famílias foram destruídas. Não foi apenas Rubens Paiva quem morreu. É preciso lembrar dos outros. E esta é uma das belezas do filme – garantir memória, lembrar do que houve, assim como o fez “A Vida é Bela” (1997), que contando uma história dentro da história lembrou que milhares de vidas foram ceifadas durante a 2ª Guerra Mundial.
Ainda não assisti aos outros filmes que podem ser indicados a melhor filme estrangeiro. Nem sei se “Ainda estou aqui” entrará na lista final do Oscar. Os entendidos dizem que é certeza que o filme será indicado a melhor filme estrangeiro com chances reais de levar a estatueta. Mas será que Fernanda Torres será indicada assim como sua mãe? Ou haverá blindagem contra o nosso português só falado aqui? Dia 23 de janeiro, saberemos. Mas independente das indicações, é preciso ressaltar que o filme baseado no livro de Marcelo Rubens Paiva é uma obra prima brasileira, sensível, mostrando a cada um de nós que o Brasil pode, sim, fazer bons filmes e contar boas histórias. Eunice Paiva, a mãe do autor, interpretada por Fernanda Torres, foi uma mulher do seu tempo, e no tempo atual, é preciso honrar sua memória. Há outras como elas. É preciso conhecer a história delas.
PS: Preciso contar que sou fã do Marcelo Rubens Paiva desde que li “Feliz Ano Velho”. Em uma Bienal do Livro em São Paulo, há muitos anos, fiquei estática diante daquele autor tão acessível em um estande. Não consegui dar uma palavra com ele, dizer o quanto havia gostava do livro. Só um autógrafo em um volume novo e nada mais. Fiquei emocionada e justifica-se – era a primeira vez que me via frente a frente com um escritor. O pior é que hoje, com certeza, talvez não fosse diferente. Eu que gosto tanto de falar fico sem palavras perto dos meus ídolos. Indico que leiam o livro e assistam o filme. Não importa a ordem. O importante é torcer. Será que o Oscar vem? Façam suas apostas!!!
😍🥰