Filmes
Está disponível no streaming da Amazon Prime Video, o filme “Adeus, Professor” (tradução sofrível para “Richard says goodbye”, direção de Wayne Roberts), com atuação excelente de Johnny Depp, sobre o que o limiar da morte é capaz de construir ou destruir em alguém e nas pessoas que o cercam. É um filme que passa ao largo dos discursos redentores comuns ao cinema hollywoodiano ao tratar de motes como a revisão de vida diante da iminência do fim e que focaliza, de modo irônico e com diálogos bem trabalhados, sobretudo, a corrosão sorrateira que certos relacionamentos sofrem ao longo dos anos, sem que os envolvidos se dêem conta disso.
Anaïs Nin
A melhor escrita da francesa Anaïs Nin não é a ficcional, faltam-lhe ritmo e coesão. O brilho mais prismático desta autora está na via autobiográfica, como inventariante dos dias em seus célebres diários, onde registrou uma vida efervescente (em alguns momentos, claramente auto ficcionalizada), circulando pela França e pela Nova York de meados dos anos 20/30 do século passado, quando conviveu com personalidades literárias e da psicanálise, como Antonin Artaud, Otto Rank, André Maurois, Lawrence Durrel, Constantin Brancusi, Henry Miller, entre outros. Um filme magistral da década de 90, “Henry e June”, de Phillip Kauffman (na mesma sintaxe de “A insustentável leveza do ser”, adaptado da obra de Milan Kundera) imortalizou a relação triangular com Henry Miller e sua esposa June Miller e o retrato de um tempo.
“Little Birds”
A Amazon Prime acaba de lançar também, pela Starzplay, a série “Little Birds”, baseada em livro homônimo de Anaïs Nin, na mirada erótica que define a obra da autora. Ambientada no Tânger (Marrocos), a transposição é bem produzida e bem dirigida por Stacie Passon; tem exuberância visual, uma fotografia linda, figurinos e trilha sonora idem, baseados na estética dos anos 50. “Little Birds” é uma pequena reunião de temas sobre os desvãos da sexualidade reprimida, quase uma suma de um tratado psicanalítico em seus primórdios.
Ficção ou fricção
Costumo dizer que há autoria ficcional e autoria friccional. Anaïs Nin é autora das fricções, o que não é em si demérito, aliás, como estilo, cai muito bem nos seus diários – o journal “Fire” é, a meu ver, uma obra prima nessa categoria de autobiografia mais livre, do ponto de vista formal. Já “Little Birds”, como obra literária, exceto pela estetização, não alcança exatamente uma via discursiva, ainda que traga algumas discussões interessantes numa narrativa que, aos poucos, vai ganhando tintas semelhantes às de Quentin Tarantino. Vale ver.