Ciscando aventuras
Filme: As pontes de Madison
(diretor: Clint Eastwood, 1995, 135 minutos)
Após a morte de Francesca Johnson (Meryl Streep), uma proprietária rural do interior do Iowa, seus filhos descobrem, através de cartas e objetos que a mãe guardou em um baú, do forte envolvimento que ela teve com um fotógrafo (Clint Eastwood) da National Geographic. A família, marido e um casal de filhos, tinha se ausentado de casa por quatro dias. Estas revelações – e uma delas dirigida especialmente aos filhos – fazem com que questionem seus próprios casamentos. Baseado no romance de Robert James Waller, cujo livro foi best-seller em 1993 nos EUA. Francesca, Meryl Streep, é uma dona de casa italiana, casada com soldado americano, emigrante. Robert Kinkaid, Clint Eastwood, vai ao condado de Madison fotografar pontes cobertas. Francesca e Robert passam estes 4 dias juntos, e uma vida para guarda-los de uma forma duradoura e enriquecedora. O filme retrata em flash backs a delicada relação que constroem.
Por que gostei: uma love story, que tem um enredo bem perto de uma realidade de duas pessoas maduras, que se responsabilizam pelas suas escolhas. Não é um romance tresloucado de paixão, nem adolescente. Uma das frases de Francesca, a protagonista, é “somos resultado de nossas escolhas”. Ela fez uma escolha, e dela se responsabilizou. A química dos atores é perfeita. Clint tocava jazz no set de filmagem, criando uma atmosfera onírica e de magia que vemos durante o filme. Francesca deixa – em carta – um registro desta experiência emocional marcante, e o que significou a sua escolha. Uma bela reflexão sobre o amor e o casamento, em tempo de amores fluidos e descartáveis.
Livro: Uma aprendizagem ou o Livro dos Prazeres
(Clarice Lispector. -8. Edição – 174 pgs – RJ: Editora Nova Fronteira, 1980)
Escrito em 1969, após um incêndio provocado por ela mesma, ao dormir com o cigarro aceso na sua mão, Clarice esteve entre vida e morte. Este livro é uma ode à Vida. E, talvez, o livro de sua autoria com maior dose de esperança e fé no encontro amoroso, profundo e verdadeiro entre duas pessoas.
Por que gostei: este foi o primeiro livro que li da autora, que me despertou, na época em que li, muitas reflexões sobre o sentido de uma relação, a necessidade de reconhecimento de que o outro nos escapa, na sua infinitude de alma singular. Assim como nossa alma nos escapa, no estrangeiro que também nos habita. Um pequeno grande livro para quem “tudo vale a pena se a alma não é pequena” (Fernando Pessoa). A nota da autora é muito significativa: “ESTE LIVRO se pediu uma liberdade maior que tive medo de dar. Ele está muito acima de mim. Humildemente tentei escrevê-lo. Eu sou mais forte do que eu. C.L.”
Muitos livros de Clarice Lispector depois, creio ter entendido o sentido maior desta nota. Sua obra (romances, contos, crônicas, que li refletidamente) versa densamente sobre desencontros afetivos, amorosos; a quase impossibilidade de comunicação, já que a palavra é percebido pela autora como tão precária para exprimir sentimentos tão profundos e tão sintonizados com a vida – em eterno movimento. Uma Aprendizagem ou O Livro dos Prazeres é sobre um encontro, entre Lóri (nome de sereia nórdica) e Ulisses (o mitológico personagem da Odisseia, e nome docachorro de Clarice). Aprender a se relacionar, consigo mesmo primeiro, e depois com o Outro. Com a estrangeiridade que me habita e habita o Outro. Nomes mitológicos a ensaiar uma reflexão sobre a arte do encontro, “embora haja tanto desencontro pela vida” (Vinicius de Moraes).