A minha história em Franca
Por Leliana Fritz Siqueira Veronez
Não nasci em Franca, mas minha vida se resume aqui desde os 12 anos de idade.
Para quem morava na roça, vir a Franca era como passear em uma cidade grande.
Na verdade, sob o meu ponto de vista, considero Franca uma cidade grande, pois aqui tenho tudo que preciso, ou seja, trabalho, amigos, família e são laços que não acabam e aqui também formei minha família, sendo mãe de dois filhos.
Franca completou 200 anos e eu faço parte da história da cidade, pois resido aqui há 46 anos.
Nasci em uma fazenda próxima a Cristais Paulista, no entanto, considero-me francana, de coração. Iniciei os estudos na escola localizada na Fazenda Bálsamo, próxima a Cristais Paulista, onde fiz o primeiro e o segundo anos primários; do terceiro ano a quinta série estudei na escola Orlik Luz, no Bairro Miramontes e da sexta série ao terceiro colegial, estudei na escola Dr. João Marciano de Almeida.
Na mudança da primeira para a segunda escola não senti muito, mas da Escola Orlik Luz para a Escola João Marciano, estranhei demais por dois motivos. Primeiro por mudar da fazenda para a cidade e segundo por transferir para uma escola maior, onde tudo era novidade. Com a mudança de casa, mudaram também os amigos, alguns dos quais conservo a amizade até hoje.
Assim que cheguei à Escola João Marciano, foi lançado um concurso sobre a biografia do Dr. João Marciano. Mesmo na minha insegurança ante tantas transformações, arrisquei e fiz a pesquisa com os recursos disponíveis na época e não é que ganhei o concurso!?! Essa é a lembrança que guardo do início da minha vida na cidade e na escola “grande”. Dali para frente os enfrentamentos da vida escolar e da vida cotidiana continuaram, pois mudar da fazenda para a cidade e com poucos recursos financeiros, não foi uma luta fácil. Sou filha de pai lavrador e mãe do lar, mas os ensinamentos de honestidade e bom caráter eles conseguiram passar para os oito filhos, por isso tenho muito orgulho da educação que recebi.
Mesmo estudando em escola pública, vinda de uma escola de zona rural, consegui ingressar em uma universidade pública. Terminei o colegial e ingressei na Unesp, sendo aprovada no Curso de Direito e, passado pouco tempo do término do curso, fui aprovada no mestrado. No ano de 1994 fui aprovada no concurso público para o cargo de advogada, para atuar na assistência judiciária, no estágio do Curso de Direito da Unesp, para ensinar a prática processual aos jovens estudantes e para atender a população que não tem condição de pagar por um serviço jurídico. Portanto, desses 46 anos residindo em Franca, mais de 30 anos deles são dedicados a ensinar os estudantes do Curso de Direito a atuar na prática processual e atender à população hipossuficiente na defesa de seus direitos.
A área jurídica exige atualização constante e, na busca por aprimoramento profissional, realizei duas pós-graduações também na Unesp e ainda vários cursos e treinamentos.
Em permeio às atividades da área jurídica, sempre fiz trabalho voluntário, sendo que isso herdei de minha mãe, que fazia o voluntário inconsciente, servindo a vizinhança com seus remédios caseiros e doações, sendo ela bem conhecida, pois era também a benzedeira da rua. Do meu pai acredito que tenha herdado o exemplo de honestidade e alguma habilidade artesanal. Meu pai era um “faz tudo”, fazia colher de pau, cestas balaios, cercas, aplicava injeção no povo da roça (antigamente podia rsrs), cantava em folia de reis e de vez em quando arriscava na culinária.
Antes de minha atuação como advogada, trabalhei como manicure, vendedora e auxiliar de costureira. Trabalhei também três anos em um reembolso postal e nove anos como secretária de meu irmão mais velho, que também é advogado. E já que estava cursando a faculdade de Direito, uni o útil ao agradável e inicie os primeiros passos na prática profissional durante o tempo que trabalhei como secretária.
Desses 200 anos, acredito que participei da história da cidade, seja nos diversos trabalhos que exerci, no trabalho voluntário e também nos mais de 30 anos levando conhecimento e orientação jurídica aos estudantes do Curso de Direito da Unesp, vindo estes de várias cidades do país e também levando informações a milhares de pessoas em situação vulnerável e que não têm recursos para um atendimento jurídico de qualidade.
Leliana Fritz Siqueira Veronez é advogada da Unidade Auxiliar Centro Jurídico Social da Unesp de Franca; mestre em direito e vice coordenadora do Verdejar do Grupo Mulheres do Brasil Franca
Esse texto faz parte da série "O que elas têm a dizer" em que escritoras de Franca homenageiam a cidade pelos 200 anos, comemorados no próximo dia 28 de novembro. Publicamos um texto por dia, ao longo de mais de 40 dias, nos estilos de conto, ensaio, poesia… escritos por mulheres. Soraia Veloso, colaboradora deste portal, escritora e francana de coração, é a idealizadora do projeto.