Na verdade, esta parábola não é uma exaltação, um aplauso à eficiência, não é uma apologia à quem sabe lucrar, não é um hino à meritocracia, mas é um verdadeiro protesto contra o cristão que muitas vezes é morno, sem iniciativa, satisfeito com o que faz, porém muito temeroso diante das mudanças exigidas pelos novos desafios ou pelas mudanças nas condições culturais da sociedade.
A parábola nem sequer confirma o “ativismo pastoral” de que são vítimas muitas comunidades cristãs, muitos “agentes pastorais” que não sabem compreender a esterilidade de todos os seus esforços, mas Jesus, na Parábola, quer suscitar na comunidade cristã a consciência, a responsabilidade, a laboriosidade, a audácia e acima de tudo a criatividade. Não é a quantidade de ações, de obras, nem a conquista de prosélitos que tornam cristã uma comunidade, mas a sua obediência à palavra do Senhor que a empurra para novas fronteiras e para as periferias existenciais da Sociedade.
Leiamos então com inteligência esta parábola cuja perspectiva – repito – não é económica nem financeira; não é um convite ao ativismo, mas à vigilância que permanece na espera, não satisfeita com o presente, mas totalmente orientada para a vinda do Senhor. Ele já não está entre nós, na terra, partiu em viagem e confiou aos seus servos, aos seus discípulos, uma tarefa: multiplicar os dons dados por Ele a cada um. Depositou em todos a sua confiança ilimitada, confiando-lhes os seus bens. Cabe, portanto, aos servos não trair a grande confiança do senhor e administrar com sabedoria os bens recebidos, que não são propriedade deles, mas do Senhor, que lhes dará a recompensa quando retornar. O mestre dá a cada um segundo a sua capacidade, e o seu dom é também uma tarefa: salvaguardar e fazer frutificar.
Para além da imagem dos talentos, o que é, afinal, esse dom? Segundo Santo Irineu de Lyon, é a vida concedida por Deus a cada pessoa e poderíamos ainda acrescentar como dom recebido: a Fé Batismal. A vida é um presente que não deve de forma alguma desperdiçada, ignorada ou desprezada. Infelizmente – devemos notar – que para alguns, a vida não tem lá tanto valor assim: não a vivem, antes desperdiçam-na e estragam-na “a ponto de torná-la insuportável e sem sentido” (Konstantinos Kavafis). A Fé Batismal é aquele dom recebido, como aquela semente de mostarda, que depois cresce e transforma-se numa árvore frondosa.
“Depois de muito tempo” – frente à demora da Parusia e da vinda gloriosa do Senhor (cf. Mt 24,48; 25,5) – o mestre regressa e pede contas da confiança que depositou nos seus servos, que devem mostrar capacidade de serem responsáveis para com os talentos recebidos. Chegamos aqui no desfecho da Parábola, onde todos eles se apresentam diante do Senhor e prestam conta daquilo que lucraram com os talentos recebidos. Dois deles ouviram o elogio: “Muito bem, servo bom e fiel, … entra na alegria do teu Senhor”. Mas ao que tinha recebido apenas um talento e acabou por enterrá-lo, o Senhor respondeu: “Servo mau e preguiçoso. Este servo, levado pelo medo, pelo comodismo e pela preguiça, não valorizou o talento que recebeu! No dia do Juízo final, estes dois tipos de pessoas aparecerão diante de Deus:
- Quem recebeu e fez frutificar o dom que recebeu,
- e quem recebeu o dom e nada fez.