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Autor de ataque a jornal em Olímpia era contra medidas de restrição à Covid, diz polícia

O ataque à sede do jornal Folha da Região em Olímpia (SP), onde funciona também o portal IFolha e uma rádio comunitária, foi cometido por um bombeiro municipal que não aceitava as medidas de restrição à Covid-19 defendidas pelo jornalista proprietário dos veículos, disse nesta quinta-feira (1º) a Polícia Civil da cidade.

O bombeiro Cláudio José Azevedo de Assis, 55, se apresentou na quarta-feira (31), confessou o crime e responde em liberdade. O crime foi cometido no último dia 17, quando o imóvel que abriga o jornal, o portal e a rádio, além da residência do editor no andar superior, foi alvo de um ataque que provocou um incêndio. O jornalista José Antônio Arantes, 62, sua mulher e uma neta acordaram às 4h30 com as chamas e a fumaça provocadas pelo ataque.

O combustível usado no incêndio foi jogado na porta do jornal e um balde com o restante do líquido foi abandonado no local. Segundo o delegado Marcelo Pupo de Paula, Assis não concordava com a linha editorial do jornal. Com a pandemia, o veículo tem feito duras críticas a negacionistas e defende o isolamento social como medida de contenção da Covid-19.

O jornal semanal é o mais antigo e tradicional de Olímpia, com mais de 40 anos de existência, e é o único que circula em versão impressa no município, que fica na região de São José do Rio Preto. Além de editar o jornal, Arantes apresenta, com sua filha, um programa diário de rádio que é também transmitido por redes sociais. Ele é presidente da Rádio Cidade, uma emissora comunitária.

No jornal e em suas falas, adota postura de defender as medidas de isolamento social e fechamento de atividades não essenciais, transformando o jornalista em alvo de ataques nas redes sociais ainda na semana anterior ao incêndio.
Com 55 mil habitantes, Olímpia tem 23 mil leitos em sua rede hoteleira, o que dá uma dimensão da importância do turismo para o desenvolvimento econômico local. De acordo com o delegado, foi possível chegar à autoria do crime após análise de câmeras de segurança, que mostram Assis saindo de sua casa em uma moto, com uma mochila nas costas, às 4h10 do dia 17. O crime ocorreu minutos depois.

O bombeiro, após o crime, viajou para Linhares (ES) e retornou nesta quarta-feira (31). A polícia soube e foi à sua casa, onde reside com a mãe e uma irmã, mas não o encontrou – tinha ido ao médico. Os policiais tiveram autorização da família para entrar no imóvel e encontraram a moto estacionada na varanda, além da mochila e de um capacete, no quarto. Os três itens foram apreendidos. “Confrontamos a mochila que está apreendida com as imagens do dia do incêndio e não houve nenhuma dúvida de que era a mochila utilizada. Depois, o advogado me ligou dizendo que estava com ele no escritório e que ele queria confessar o crime”, disse o delegado de Olímpia.

De acordo com ele, o bombeiro confessou o ataque, mas a investigação não está concluída. Assis responderá inicialmente pelo crime de incêndio. “Cabe a mim investigar os pontos que não acreditar ou não aceitar. Mas ele de imediato fala dos problemas familiares, dos problemas pessoais, das divergências escritas pelo proprietário da Folha da Região, o senhor Arantes, fala até mesmo da Covid que ele tinha pego e tudo, mas que agiu sozinho e não tem nenhuma outra pessoa envolvida no fato”, disse.

Ainda de acordo com o delegado, não há dúvidas sobre a autoria, mas falta ainda descobrir se há ou não um mandante e outras pessoas envolvidas. Por isso, ele pediu a quebra do sigilo telefônico do servidor municipal e pedirá a quebra do sigilo bancário.

À polícia Assis disse que jogou seus celulares num rio entre Olímpia e Severínia. Por isso, na próxima segunda-feira (5), a polícia também irá pedir ao Corpo de Bombeiros que faça uma varredura no fundo do rio em busca dos aparelhos.
Assis não teve prisão decretada, segundo o delegado, por ter feito uma confissão espontânea. “O ato covarde, essa mancha na vida dele, vai ficar pelo resto da vida, só que ele não tem histórico de violência, a ficha policial dele é limpa, ele tem emprego fixo, tem residência fixa, reside com a mãe e a irmã, os filhos estão na cidade, ele é filho de Olímpia e está na ativa. Não vou pedir por ora, mas não descarto num futuro próximo se entender necessário”, disse.

Em seu depoimento, ele chegou a criticar, pelos mesmos motivos apontados contra o editor do jornal, o prefeito de Olímpia, Fernando Cunha (PSD), que nesta quinta foi diagnosticado com Covid-19. “Ele falou que não conhece o Arantes, [tem] apenas divergências nas colocações do escritor, do jornalista, nas escritas dele, que ele não aceita, e essas divergências que causou, ele estava meio revoltado com governantes, […] talvez o Fernando Cunha, prefeito, desses lockdowns, dessas coisas que muitos vão contra, mas a ciência, os médicos, a Organização Mundial da Saúde, são a favor. Eu também sou e o Arantes também é. Por isso ele também seria um desses motivos”, afirmou o delegado.

Assis atua há mais de 20 anos na unidade local do Corpo de Bombeiros. A Prefeitura de Olímpia divulgou comunicado em que manifestou “repúdio à conduta” do servidor público, o afastou de suas funções e vai instaurar um processo administrativo. “Em depoimento, entre as causas, o servidor cita motivações políticas e administrativas e, inclusive, faz ameaças a governantes, com ênfase na figura do prefeito municipal. Diante da gravidade do fato, o município informa que irá afastar o servidor de suas funções e instaurar um processo administrativo para apurar a ocorrência, tendo em vista que, mesmo que seja uma ação particular ocorrida fora do expediente, o ato é totalmente incompatível com os princípios do cargo público que o mesmo ocupa”, diz trecho do comunicado.

A prefeitura ainda disse que desde o início tem colaborado com as investigações policiais. A Fenaj (Federação Nacional dos Jornalistas) e o Sindicato dos Jornalistas de São Paulo se solidarizaram com o jornalista e sua família pelo ataque sofrido em Olímpia. A Folha não conseguiu ouvir a defesa do bombeiro na noite desta quinta-feira.

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