A justiça é uma questão filosófica de entendimento complexo para a sociedade. É uma incógnita para o homem médio compreender e descercar este juízo que é na verdade um freio social para nossas paixões humanas. Não é novidade nenhuma tratar sobre este tema, que a pelo menos desde a Grécia antiga muitos pensadores se debruçaram sobre esta reflexão. De modo que, em certa medida é baseada em uma moral comportamental individual em prol de um resultado pacificador de conflitos coletivos.
Pensadores como Platão e Aristóteles tinham definições conceituais harmônicas, no sentido de que a justiça existe para de alguma forma trazer o equilíbrio de tratamentos sociais em busca de uma equidade. Para um baseado em uma regra legal criada pelo Estado, e para outro o tratamento de forma igualitária na medida da desigualdade do indivíduo. Refere-se ao conceito da equidade como base para se alcançar a justiça. Para Platão o “conceito de justiça abrange tanto a dimensão individual quanto coletiva: a justiça é uma relação adequada e harmoniosa entre as partes beligerantes de uma mesma pessoa ou de uma comunidade” .
Já Aristóteles, “definia justiça como sendo uma igualdade proporcional: tratamento igual entre os iguais, e desigual entre os desiguais, na proporção de sua desigualdade” . Percebe-se que ambos conceitos são imprecisos. Talvez seja por isso que esta questão ecoa no corredor do tempo até os dias de hoje. Para o homem médio nos tempos atuais, suas ações ou omissões, já não é o juízo de valor certo ou errado, justo ou injusto, dentro de um bom-senso moral que o dirige. A questão é a “honra” ferida baseada no seu narcisismo. No seu modo de entender o mundo, como sendo o centro das coisas mundanas. Assim, toda conduta é feita a partir de seu egocentrismo ferido para fora, justificando sua dor, feito um bebê que não admite limites.
A exemplo do homem que foi morto a pauladas em fevereiro de dois mil e vinte dois, tenta-se justificar a atitude do agressor nesta conduta egocêntrica que ele ágil baseado a honra ferida. Onde já se viu, cobrar-lhe? Quem ele (leia-se trabalhador) pensa que é em cobrar seu salário? É um estrangeiro e quer exigir? Diante disto, agem ferozmente feito animais reptilianos. Isso não é uma novidade na sociedade. Na história dogmática do direito há menções sobre a forma de organização dos babilônios frente aos conflitos de interesses sociais.
A expressão “olho por olho, dente por dente”, significa punir alguém da forma semelhante a conduta exercida primitiva. Ou seja, se o outro me desfere pauladas ou age de alguma forma contra mim, posso eu também fazer da mesma forma contra ele. Não se trata de um regramento de organizações criminosas, isso era talhado como norma legal no primeiro império da Babilônia antiga a aproximadamente 1.700 a.C, no primeiro código de conduta escrito da história do direito. Estou tratando do Código de Hamurabi, que vigorou na Mesopotâmia, e era baseado na Lei de Talião.
Ora, observa-se que há um retrocesso civilizatório em que a barbaridade de algum modo recebe o aval social. Quando a violência é velada – ou exposta mesmo como hoje – e a sociedade ignora, está na verdade havendo uma chancela, um calar que resulta consentimento. Então, a “justiça” da Mesopotâmia não está tão distante da nossa “justiça” de homens do sec. XXI, os ditos civilizados. A constituição de um poder estatal, que tem o poder de polícia como ferramenta de investigação para materialização do crime e construção inicial de denúncia oferecida pelo fiscal da Lei, somada a disponibilidade do direito de defesa, levado ao magistrado que representa o judiciário como poder do Estado, parece-me ter perdido a credibilidade.
Assim sendo, diante de tanta fúria desmedida, barbárie como tempos milenares do passado, covardia sem pudor, psicopatia de justiceiro, nos deparamos com bípedes sem penas de mãos sujas de sangue. Claro, justificando sua ferocidade por “ter perdido a cabeça”. Mata-se seu semelhante forasteiro amarrado, por cobrar seu salário atrasado. É o retrato da selvageria que não choca mais ninguém por aqui.
A passos largos vem uma “justiça dos homens” que é livre de limites, apaixonada, barbara e descomunal. Mahatma Gandhi nos advertia com sabedoria que “olho por olho um dia ficamos todos cegos”. Já estamos com uma película de cegueira que ainda pode ser revertida. Que a indignação seja uma força motriz, mas dos verdadeiros civilizados.