Antes de adentrar no tema da Jornada de Trabalho semanal reduzida de 4 dias, permita-me refletir sobre algumas questões que considero macro e de cunho objetivo. Primeiro, ao analisarmos a história evolutiva da ocupação humana através do trabalho, o direito ao ócio é disponibilizado ao detentor do poder. Neste caso, estou falando do empregador. Desde a antiguidade, a atividade manual ou corporal era direcionada a aqueles que não tinha o que nomearam na filosofia de “virtu”. Para os filósofos, como Maquiavel, a “virtu” – virtude – é uma possibilidade de poder escolher, o que conhecemos por livre-arbítrio.
O trabalhador ao vender sua força de trabalho está na verdade assinando um contrato de adesão. Para o direito o contrato de adesão é um título em que uma das partes disponibiliza as regras da relação, e a outra pode aceitar ou não. Porém, aceitando não tem a oportunidade de sugerir ou exigir mudanças para equilibrar a relação. Como o trabalho é fator de sobrevivência ao trabalhador, não resta outra ocasião a não ser aceitar em sua grande maioria. Assim está disposto, portanto, a vender seu tempo disponível no decorrer do dia, em troca de um montante (salário) que garante a manutenção da sua vida.
Deste modo, usando seu corpo (leia-se diversas formas de trabalho como manual ou intelectual) na maior parte do dia como força motriz para produção de riquezas, não resta tempo hábil para usufruir das benesses que uma vida valorosa pode disponibilizar. O tempo livre para o trabalhador é colocado como desvalor. O trabalhador com tempo livre, ou que pensa em usufruir do “ócio” é posto como preguiçoso. O ócio para o empregador é virtude, capacidade, liberdade, oportunidade. Para o trabalhador é preguiça, desinteresse, acomodação.
A qualidade de vida no trabalho, surgiu para suprir demandas comportamentais e resultados que podem melhorar a produtividade. Não me parece plausível que seja uma criação capaz de solucionar toda a complexidade política da luta de classes entre o empregado e empregador. Vejo como uma medida paliativa, possível de ser aplicada dado a aceitação do detentor do poder. Que no seu interesse íntimo buscará sempre o acúmulo de riquezas, maior produtividade e melhor performance do trabalhador.
Observa-se que a possibilidade de implementação de ações que busque a qualidade de vida no trabalho, vem átona diante ao cenário que atrapalha a produtividade como: funcionários com alto grau de estresse no trabalho, diagnosticados com burnout, ansiedade, crise do pânico dentre outras. Tudo isso resulta em afastamentos, tornando-se uma questão de cuidado a saúde. Resultando, em parte em prejuízos financeiros ao detentor do capital.
Equacionar os interesses das classes, parece-me uma questão muito distante de acontecer em nosso tempo. Trata-se de uma complexidade debatida a aproximadamente cento e cinquenta anos sem uma convergência entre os interessados. A tecnologia surgiu para melhorar, acelerar e escalar a produção. Isso, afastou a subjetividade (leia-se processo criativo na construção de algo) do trabalhador na construção do produto. Percebe-se que tudo é padronizado, exige-se um grau de perfeição, de menor durabilidade para que acabe e construa outro. É a manutenção do ciclo do consumo. A liquidez.
Talvez o que vou dizer, pode não agradar. A Jornada de Trabalho semanal reduzida de 4 dias, tem sido experimentada dado aos benefícios que convencem as empresas, não necessariamente a qualidade de vida do colaborador. Pode resultar em uma melhora na qualidade de vida desde que não gere prejuízo. Atualmente, o maior bem que uma empresa pode ter é a capacidade e liberdade da criatividade dos colaboradores. É valoroso para todos, para os resultados da empresa que muitas vezes encontra problemáticas constantes dado a diversidade, dinamismo do mercado e complexidade de processos, que sem dúvidas depende da criatividade humana. Sem contar da velocidade na resolução de problemas. Estou falando da melhora na criatividade na realização das atividades que resulta em maiores resultados financeiros.
A possibilidade de o colaborador cuidar de suas responsabilidades pessoais com a família, filhos e estudos. Sobretudo, poder de algum modo desfrutar do ócio que é a oportunidade de poder vivenciar outras experiências que não seja apenas a profissional, melhora seu ânimo. Isso resulta em um mínimo de qualidade de vida, que o faz se esforçar para garantir a manutenção de seu emprego. Melhora a sua performance. É a chamada possibilidade de conciliar melhor a vida pessoal e a profissional. Afasta a ideia de divisão do ser entre vida pessoal e profissional. Aquela máxima de não confundir as coisas pessoais com as profissionais. Deixar os problemas pessoais da porta para fora do trabalho. Não gera melhor resultado.
Portanto, a jornada de trabalho semanal reduzida de 4 dias, é uma medida que não resolve a questão da luta de classes, e não tem essa intenção, porém pode diminuir grandes questões comportamentais. Dado ao resultado de diminuição do estresse no trabalho, do sentimento de desgaste ao final do dia, ao esgotamento por excesso de trabalho, sobretudo mantendo ou aumentando a produtividade em resultados de empresas.