Opiniões

O Tempo que vai nos levando…

No dia 29 de dezembro, antepenúltimo do ano de 2022, íamos de automóvel para Brodowski, visitar o Museu Casa de Portinari e também as obras do autor que adornam a Igreja do Bom Jesus da Cana Verde, em Batatais, quando fomos ultrapassados por uma SUV que ia a mais de 140 quilômetros por hora. O veículo passou, freou e derivou rapidamente à direita, cortando a nossa frente, para alcançar a alça de acesso à cidade de Batatais. Ficamos torcendo para que, na sequência, conseguisse fazer uma curva à esquerda, sob a ponte da rodovia em que seguíamos e retomasse o rumo de Batatais.

Segundo os cálculos do Ênio (um filho que estava conosco no carro), a vantagem em termos de ganhar tempo para quem dirige a 140 km/h em relação a quem o faz a 100 km/h, entre Franca e Batatais, é de menos de dez minutos. Para ser exato, é de 9,6 minutos! O que poderíamos fazer em nove ou dez minutos? Tomar um café, talvez? Se não estiver muito quente… Reabastecer o carro? Com certeza, porque se gasta bem mais combustível em alta velocidade. E há maior desgaste dos pneus, do motor, do motorista, risco de acidentes maior. Além, claro, de nem o motorista, nem os passageiros poderem apreciar a paisagem. Nem mesmo conversar com algum sossego.

Claro que há razões lógicas para se ganhar tempo na vida. Afinal, tempo é dinheiro, diz o ditado popular. E todos corremos para aproveitar bem o tempo. Só não nos damos conta de que quanto mais corremos, menos percebemos a vida passar, como no caso do automóvel em alta velocidade. Na verdade, às vezes nos assustamos com a rápida da passagem do tempo que nos leva ao fim da jornada… Mas logo nos distraímos de novo e retomamos a corrida contra o tempo! Não obstante, como observou com o poeta Mário Quintana: “Quando se vê, já é sexta feira! Quando se vê, já é natal… Quando se vê, já terminou o ano… Quando se vê, perdemos o amor da nossa vida. Quando se vê, passaram 50 anos!”

Afinal, o que é o tempo? No sentido em que o estamos considerando, podemos adotar a mais simples acepção, como a do vetusto dicionário português Lello Universal, em meado do século passado: é a “duração calculável das coisas”; ou uma acepção um pouco mais moderna do dicionário Houaiss: “período contínuo e indefinido no qual os eventos se sucedem”.


Mas, há mais: há a definição da Física moderna: “o tempo é uma dimensão do Universo em que vivemos”. Portanto, está diretamente relacionado com o espaço em que vivemos e nos impacta diretamente, afetando os fatos mais elementares da nossa vida. Não é difícil perceber isso. Basta que atentemos para as nossas fotografias tiradas ao longo da vida e perceberemos a implacável ação do tempo.

Na verdade, é a ação da luz (da radiação), do oxigênio, da gravidade, combinados com o tempo que nos consome. Não de imediato, mas em reação no espaço-tempo. Os corpos que abrigam a vida são processos, fenômenos temporários, que nascem e se desenvolvem em um lapso de tempo e, ainda que sem qualquer outras intercorrências, extinguem-se naturalmente em um prazo mais ou menos previsível. Por enquanto! Mas a vida continua um mistério. E a consciência então? Será que esta existe apenas nos humanos? Por ora, sabemos que ambas, vida e consciência, existem e que são boas! Mas, um fato é inexorável: o aumento da velocidade, estica mesmo o tempo. No caso dos automóveis referidos, a cem e a cento e quarenta por hora, este último “ganhou”, para os seus passageiros, quase de dez minutos de vida a mais no percurso entre Franca e Batatais. Na hipótese, (considerado apenas o ambiente exterior aos automóveis), o nosso carro, a cem por hora, gastou 24 minutos das nossas vidas no percurso entre Franca e Batatais. A SUV, a 140 por hora, gastou 14,4 minutos da vida dos seus passageiros no mesmo percurso, de modo que ganhou quase dez minutos para tomarem o café. Com um pouco mais de riscos e desgastes…

Dr. José Borges

Advogado (Formado em Direito pela Faculdade de Direito de Franca); especialista em Direito Civil e Direito Processual Civil e em Direito Ambiental. Foi Procurador do Estado de São Paulo de 1989 a 2016 e Secretário de Negócios Jurídicos do Município de Franca. É membro da Academia Francana de Letras.

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