Opiniões

A hora e a vez das novas gerações

Ao concluir a tarefa de carpir o mato de cerca de quatrocentos pés de café cultivados numa pequena chácara, o homem, já beirando os oitenta, se aproximou, grave, com a enxada nas mãos:

– Terminei, doutor. Para onde vou agora? – querendo dizer que queria direcionamento para outro trabalho.

– Começa de novo lá na ponta, seu Joaquim – disse o proprietário, apontando para o início da lavoura, onde o trabalho fora iniciado dois dias antes. Gasta a hora que falta para completar o dia por lá.

Meio encabulado, depois de alguma hesitação, o lavrador justificou:

– Mas eu campinei bem campinado, doutor… Inclusive bati a terra das raízes das tiriricas… Como o senhor pediu.

– Ora, seu Joaquim, não é isso, dê uma olhada… Faz dois dias que o senhor passou por lá e o mato já está crescendo de novo…

Meio a contragosto, o homem voltou à cabeceira da pequena lavoura, argumentando que as tiriricas têm raízes muito fundas, que para acabar com elas é preciso trabalho especial, com a remoção das cebolinhas que se formam nas raízes, etc.

– O serviço ficou muito bom. A Natureza é que é mesmo teimosa, seu Joaquim…

 Um leve sorriso voltou ao rosto do velho lavrador, que passou a se mover com novo ânimo.

Parece bobagem, mas o dilema do pequeno diálogo acima é a principal causa da sobrevivência da humanidade nos últimos dez mil anos: a capacidade de recomposição dos ecossistemas da Terra. A História nos informa que o Homo sapiens iniciou a agricultura algo em torno de doze mil anos atrás. De lá para cá, os humanos se estabilizaram como espécie, escapando do equilíbrio natural que prevalece para as demais espécies. A Natureza, que lhes pareceu hostil por milênios, a partir de então foi aos poucos sendo dominada, até chegar ao momento atual.

A partir do início do século XX, o Homo sapiens domou de vez o ambiente e controla suas áreas de cultivo ao ponto que leva à extinção espécies consideradas “daninhas”. E não é só isso: a ocupação integral de grandes áreas por cidades e por empreendimentos econômicos impossibilitam a regeneração natural, fazendo com que dezenas de espécies sejam extintas a cada ano. As antigas gerações, marcadas pela luta contra as adversidades do meio, pouco se importam com isso. Os seus métodos, que conduziram bem a espécie até aqui, embora mereçam respeito, já não condizem mais com as necessidades atuais.

Apesar do marcante retrocesso verificado no Brasil em período recente, nota-se que mesmo por aqui há uma cultura formada nas últimas décadas que impede o caos total em relação ao meio ambiente. Por outro lado, novas gerações aos poucos estão tomando posição sobre o assunto, como tem ocorrido na Europa. Esse parece ser esse o caminho. Quanto aos mais antigos, urge que atualizemos nossos conceitos!

Dr. José Borges

Advogado (Formado em Direito pela Faculdade de Direito de Franca); especialista em Direito Civil e Direito Processual Civil e em Direito Ambiental. Foi Procurador do Estado de São Paulo de 1989 a 2016 e Secretário de Negócios Jurídicos do Município de Franca. É membro da Academia Francana de Letras.

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