Colunas

Os donos da seca

A última coisa que os oligarcas do Nordeste querem é que falte sede. Não da população – mas da dependência. Afinal, quando o caminhão-pipa vira moeda eleitoral, não é a água que vale ouro, é o voto comprado com ela. No Brasil profundo, onde o sol castiga mais do que o Estado ajuda, a falta de água é mais do que uma tragédia ambiental: é uma estratégia de poder. E é justamente aí que o projeto “Leve Poço”, anunciado por Renan Santos, coordenador nacional do Movimento Brasil Livre (MBL), entra com uma pedra no sapato – ou melhor, um poço no quintal – dos senhores feudais da política nordestina.

O problema é antigo — e conveniente para alguns

Por décadas, a escassez de água no semiárido nordestino foi tratada como uma fatalidade do clima, um carma geográfico. Mas a verdade, para quem se arrisca a olhar além do discurso oficial, é que essa “fatalidade” interessa a muita gente. Os famosos “coronéis” da política nordestina – uma elite econômica e política que mantém seu poder através de práticas clientelistas – construíram seus impérios à base de favores e dependência. A distribuição de água por caminhões-pipa, bancada com dinheiro público, é o exemplo mais emblemático: uma solução temporária que nunca resolve o problema, mas sempre garante o controle.

Enquanto isso, políticas de infraestrutura hídrica de longo prazo são sistematicamente negligenciadas, engavetadas ou sabotadas. O motivo? Poço não pede voto. Caminhão-pipa, sim.

O Leve Poço: um projeto que perfura a hipocrisia

É nesse cenário de vício institucional que surge o “Leve Poço”, um projeto que não só pensa diferente, como age diferente. Não estamos falando de promessas em palanque nem de planos mirabolantes. O MBL, frequentemente demonizado por setores da esquerda e da direita bolsonarista, resolveu meter a mão na terra – literalmente – e propor uma solução que tem tudo para quebrar o ciclo de miséria hídrica: poços artesianos sustentáveis, movidos com energia solar, com gestão comunitária e foco em autonomia econômica.

A proposta é simples na ideia, mas revolucionária na execução: construir poços que não apenas forneçam água, mas formem um novo modelo de gestão comunitária, agrícola e econômica. Com tecnologia avançada, sistemas eficientes e capacitação local, o projeto visa transformar vilas dependentes em comunidades autossuficientes. Tudo isso sem pedir favor para “coronel” nenhum – aí mora o perigo, para os de sempre.

Uma ameaça real ao sistema da pobreza lucrativa

Os defensores do velho modelo, que adoram posar de heróis em tempos de seca, têm razões para suar frio. Um poço que funciona, que é tocado pela comunidade e sustentado por doações rastreáveis, não só mata a sede como ameaça o mercado da miséria. O “Leve Poço” rompe com a lógica de dependência e expõe como o sistema atual é mantido com a escolha deliberada de não resolver o problema.

Em vez de contratos milionários com empresas de transporte de água – muitas delas ligadas a políticos locais – o projeto propõe transparência, escala e independência. Cada doador ganha certificado, acesso ao andamento das obras e, a depender da quantia destinada, o nome gravado em placa. Parece simples? É. Mas simples, no Brasil, costuma ser revolucionário quando ameaça o feudo de alguém.

Não é caridade: é estratégia com impacto real

É importante frisar: o projeto do MBL não é filantropia. É ação política no melhor sentido do termo. Política que transforma, que constrói, que confronta estruturas arcaicas com soluções modernas. Ao treinar moradores para usar, manter e lucrar com a água, o projeto injeta dignidade e iniciativa onde antes havia apenas espera e humilhação.

E, para quem torce o nariz por ser um projeto vindo do MBL – um grupo que desperta paixões e antipatia em proporções quase iguais – talvez valha a pena deixar de lado a polarização e focar no que realmente importa: o resultado. Porque, no final das contas, quem está com sede não quer saber se a água veio da esquerda, da direita ou do centro. Quer saber se ela chega.

Conclusão: quem tem medo de um poço?

O “Leve Poço” não vai resolver todos os problemas do Nordeste. Mas, se funcionar como promete – e os primeiros passos em Ipanguaçu, no Rio Grande do Norte, são promissores – pode ser o início do fim de uma lógica perversa que mantém regiões inteiras em redutos de pobreza eleitoral.

A pergunta que fica é: por que tantos governos com bilhões em mãos nunca fizeram algo tão direto quanto isso? A resposta incomoda. Mas ela escorre como água limpa por entre os dedos de quem lucra com a seca. E talvez, por isso mesmo, iniciativas como essa precisem de todo o apoio possível. Porque cada poço cavado são alguns votos livres que deixam de ser comprados. E isso, para muita gente poderosa, é o verdadeiro perigo.

Para conhecer os detalhes do projeto, acompanhar sua evolução e saber como doar, acesse: https://levepocos.com/#missao.

“Para saber mais sobre o ‘Leve Poços’ leia aqui e aqui

Dr. João Pedro Cardoso

Advogado especialista em direito de família e fraudes bancárias (OAB - SP 498.908); coordenador do Núcleo Municipal do MBL (Movimento Brasil Livre) em Franca (SP).

Um Comentário

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Artigos relacionados

Verifique também
Fechar
Botão Voltar ao topo