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Dúvidas e medos fundamentais

As velhas, mas sempre inquietantes dúvidas, ainda nos perseguem a todos, ateus, agnósticos, religiosos, operários, doutores… de onde viemos? Qual o desígnio da vida? Para onde vamos? Ou: a consciência e tudo o mais acabam quando corpo se deteriora? Parece que são questões que sempre assombraram a humanidade. Podemos especular que surgiram com o pensamento abstrato, quando hominídeos, nas cavernas, passaram a se ocupar de afazeres para além da busca de alimentos e da defesa contra predadores. Antropólogos creem que foi nesse período que inventaram as divindades, numa tentativa de justificar o que não entendiam: a chuva, as tempestades, os ventos, as estações… Aos deuses foram atribuídos os segredos do Universo, para trazer um pouco de serenidade à alma humana, dispensando-a de investigar tais mistérios diretamente. Com maior sofisticação da sociedade, surgiram as religiões e seitas, com rituais e sacrifícios para adorar ou para aplacar a fúria dos deuses, senhores do bem e do mal e de todos os segredos.

Até hoje a investigação da origem, do propósito e da finalidade da vida constitui um dos principais objetos de pesquisa da sociedade humana, através da ciência e da Filosofia. À cata de respostas são vasculhados desde os micromundos dos quintais às mais distantes estrelas do Cosmos. As religiões foram evoluindo e hoje são dezenas de milhares, todas importantes para fornecerem alívio para as dores causadas pelas dúvidas que ainda assolam aqueles que não conseguem por si próprios buscar as respostas por que anseiam. A condição para aderir a uma religião é ter fé, que pode ser definida como crença e adesão incondicional à doutrina que prega. Todas as religiões resolvem o sofrimento causado pelas dúvidas inatas da humanidade. Mesmo as doutrinas que dizem estudar os assuntos relacionados com Deus e a vida, trazem as suas verdades fundamentais estabelecidas. Não admitem discussão dos seus fundamentos.

Apesar de ser maioria os que creem na continuidade da vida além-túmulo, muitos não assumem religiões e poucos são os ateus assumidos. Nos tempos atuais há certa rebeldia aos cultos e às religiões entre os que se consideram bem- informados. Há também novas espécies de religiosidades desvinculadas das religiões organizadas: são aqueles que mantêm a crença na existência de uma instância superior que governa a vida na terra e em outras dimensões e que cultuam certo espiritualismo autônomo e independente. E há ainda quem prefira acreditar num deus apreendido pela razão, como o concebido por Espinosa, possivelmente por questão de vaidade ou de desconfiança nas religiões e nos espiritualistas autônomos. Espinosa, judeu excomungado pela Sinagoga sob a acusação de ateísmo, por negar a verdade das Escrituras e o Deus nela revelado, substituindo-o por um Deus-Natureza, assim o define: “Deus é imanente, causa de si, que existe em si e por si, que se produz no ato pelo qual cria a Natureza…” Logo, Deus para o filosofo é também matéria e não espírito puro, como afiançado pela Teologia e pela Filosofia. Nega a fé e só aceita o poder natural da razão, como esclarece Marilena Chauí, escritora e filósofa brasileira especialista na obra de Espinosa.

Certamente as pessoas de fé também já tiveram suas dúvidas e as resolveram por esse caminho: a adesão a uma religião. Merecem absoluto respeito, porque fé é questão de foro íntimo e está imune a considerações exteriores. Mas, desconfia-se que os religiosos são também os mais assombrados, não com o fogo do inferno – a punição para quem não tem fé segundo as duas maiores religiões do mundo – mas, com medo de que a vida definitivamente acabe com a deposição do corpo ao túmulo, reduzida ao reles pó da terra.

Mas, a despeito de todas as discussões filosóficas, teológicas e críticas às religiões e suas verdades definitivas, muitas vezes singelas, é mais ou menos assente que a maioria de nós – incluídos, os ateus e agnósticos – nutre alguma esperança de que após o ciclo biológico ainda reste, mesmo que de forma tênue, algum resquício de vida que possa sair voando por aí…

Dr. José Borges

Advogado (Formado em Direito pela Faculdade de Direito de Franca); especialista em Direito Civil e Direito Processual Civil e em Direito Ambiental. Foi Procurador do Estado de São Paulo de 1989 a 2016 e Secretário de Negócios Jurídicos do Município de Franca. É membro da Academia Francana de Letras.

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  1. Luis Márcio de Sousa. Professor Educação Física ( formado Claretiana Batatais) Técnico em Mecânico ( EE. Torquato Caleiro Franca) e Mediador judicial.

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