A anistia como obra de consenso

Depois de defender por mais de dois anos que o ocorrido no dia 8 de janeiro de 2023 – quando manifestantes invadiram e depredaram o Palácio do Planalto, o Congresso Nacional e o Supremo Tribunal Federal – constituiu uma tentativa de golpe de Estado com liderança atribuída ao ex-presidente Jair Bolsonaro e seus ex-auxiliares de governo, o presidente Lula concorda agora com a votação da PEC da Blindagem (que exige autorização legislativa para investigação ou processo a parlamentares) e a tramitação do projeto de anistia aos atingidos pelas sanções sobre o denunciado golpe. O governante cria facilidades para o encaminhamento daquelas matérias em troca da aprovação do projeto de isenção do Imposto de Renda Pessoa Física aos trabalhadores com ganhos de até R$ 5 mil mensais e os esquemas de desoneração da conta de luz e distribuição de gás de cozinha à população de baixa renda, com os quais busca aumentar a sua popularidade para concorrer às eleições do próximo ano.
O presidente da Câmara, Hugo Motta negociou a tramitação das matérias junto ao colégio de líderes partidários e hoje faz o mesmo em relação a Davi Alcolumbre, presidente do Senado e ambos buscam entendimentos com o Supremo Tribunal Federal.
Na tramitação das duas matérias, surgiram personagens que não se relacionavam com os assuntos. O deputado Paulinho da Força foi convocado como relator para negociar e montar um relatório da anistia onde não haja indulto, mas a redução de penas, que ele próprio denomina como pacificação. O ex-presidente Michel Temer foi chamado a contribuir com sua experiência de chefe de Estado e político de longa militância. Até o deputado Aécio Neves, que esteve discreto por largo período, compareceu a reuniões sobre a anistia. Todos defendem a pacificação entre as correntes políticas e, também, com o STF.
Segundo as definições do Direito, anistia é ato do poder público que declara impuníveis delitos praticados até determinada data por motivos políticos ou penais, ao mesmo tempo que anula condenações e suspende diligências persecutórias.
O perdão aos insurretos ou faltosos – tido como instrumento de pacificação – já foi as divergências das respectivas épocas. A última vez de sua aplicação foi em 1979, através de lei votada pelo Congresso Nacional e sancionada pelo presidente João Batista Figueiredo, o último dos governantes do regime militar. Na sua entrada em vigor, o perdão libertou 100 presos políticos, reabilitou 150 banidos e ensejou a volta de 2000 brasileiros que vagavam pelo mundo em fuga das punições que os gravavam no Brasil.
Colocada em vigor a anistia, o movimento político ganhou novos contornos. Partidos colocados nas ilegalidade voltaram a funcionar, seus líderes apresentaram-se para as eleições, independente do que tivessem sofrido. A anistia beneficiava tanto os que insurgiram contra os governos militares quanto os agentes estatais acusados como praticantes de tortura e outros atos considerados ilegais. Entre os beneficiados daquele ano haviam militantes que pegaram em armas, assaltaram bancos, sequestraram e até mataram. Todos receberam tratamento equânime e alguns deles – de maior prestígio – elegeram-se para o parlamento, governos estaduais e até para a presidência da República.
O perdão de 1979 foi abrangente. Os episódios de 8 de janeiro de 2023 não têm a menor similaridade com os de décadas atrás. Apesar de haverem processos e denúncias, ainda restam dúvidas quanto à autoria e objetivos e os até agora punidos não guardam nenhuma similaridade com os adversários dos militares do regime de 1964. A única converg}emcoa [e qie maqieça época haviam indivíduos contrários ao perdão tanto aos adversários quanto aos companheiros de luta. Sobre o adversário sabe-se que é o antagonismo, mas em relação aos companheiros do mesmo mado, não era raro que o miliotante rejeitasse a reintegração do parceiro punido com o temor de que este voltasse e ocupasse o lugar que ele ou outros que não se ausentaram almejavam. Onde o homem está, independente de sua ideologia, a disputa pelos lugares de ponta é permaente. Ocorreu em 1979 e, se agora a anistia 2025 for imp0lantada, t5ambém haverão os descontentes e/ou preteridos. Ainda há a dificuldade de foro recentemente denunciada pelo ministro Luiz Fux, cujo entendimento é de que os episódios de 2023 deveriam ter sido julgados em primeira instância, não pelo Supremo Tribunal Federal, como hoje ocorre.
Partindo da premissa de que anistia é perdão, torna-se necessário que sua aplicação seja resultado de um grande acordo, onde os personagens – independente de suas colocações político-ideológicas , tenham o real e sincero objetivo de promover o reencontro da sociedade consigo mesma e, através daí, a paz.
Espera-se que Lula, Bolsonaro, seus seguidores e todas as figuras de representação e prestígio na vida nacional, tenham a grandeza de abrir mão de objetivos próprios e coloquem seu prestígio a serviço da regularidade da vida nacional. Pouco se importará o nome que se venha a dar para as providências desde que se devolva aos brasileiros a segurança e o conforto que todos têm direito.







