Presidente do Santos sofre pressão e recua sobre paralisação do futebol
O presidente do Santos, Andrés Rueda, já enfrenta a sua primeira grande pressão nos bastidores da Vila Belmiro. Depois de afirmar no início do mês ser favorável à paralisação do futebol em meio ao avanço da pandemia, o mandatário santista recebeu manifestações de descontentamento por parte da FPF (Federação Paulista de Futebol) e de dirigentes do clube.
Em entrevista ao jornal Folha de S.Paulo no último dia 4 de março, Rueda afirmou, diante do aumento de casos da Covid-19 no Brasil, que “o protocolo [do futebol] é coerente, mas, mesmo assim, a coisa foge do controle de uma maneira geral. E o futebol também tem que ter uma participação no sofrimento. Isso dói, mas precisamos parar.”
Pressionado por diretores do Santos e após uma conversa com o presidente da Federação Paulista de Futebol, Reinaldo Carneiro Bastos, o representante santista abrandou sua posição e se colocou favorável à continuação do Campeonato Paulista.
Questionada, a federação não negou a ligação, mas se limitou a dizer apenas que Carneiro Bastos mantém conversa frequente com todos os clubes filiados à entidade.
Rueda ouviu do dirigente paulista que, sem futebol, seria impossível para a entidade cumprir compromissos, como o repasse de cotas de TV, fato que aconteceu durante a última paralisação da competição, entre março e julho de 2020, além de eventuais ajudas pontuais ao clube, que atravessa grave crise financeira.
Em outubro, poucos dias depois de assumir a presidência do Santos após o afastamento de José Carlos Peres, o antecessor de Rueda, Orlando Rollo, decidiu subir a serra e ir à sede da FPF para pedir ajuda financeira. A entidade prometeu adiantar quase R$ 1,5 milhão a que o clube tinha direito proveniente de patrocínios do estadual.
Andrés Rueda recebeu não só a ligação, como uma série de aconselhamentos internos após a entrevista à Folha de S.Paulo. Ouviu de membros do Comitê Gestor do Santos que a fala poderia custar milhões aos cofres do clube, além da necessidade de um esforço para reatar o laço com a entidade.
Na reunião da última terça-feira (16) com a Federação Paulista de Futebol, Rueda selou a mudança de opinião. Os presidentes dos 16 clubes da elite do estado, além de representantes de sindicatos de atletas, árbitros e treinadores, concordaram com a FPF de que o campeonato não tem que parar. A entidade tem como estratégia recorrer à Confederação Brasileira de Futebol (CBF) e, se necessário, até mesmo ingressar com ação judicial conjunta. Nenhum dos clubes se opôs.
“Foi unânime entre os clubes que precisamos lutar pelo campeonato. É uma decisão de todos, que fique claro: sindicatos, atletas, clubes, árbitros… Todos querem que o campeonato continue”, disse o presidente do Santo André, Sidney Riquetto. Na videoconferência, cada um dos presidentes pôde fazer alguma ponderação ou se opor à continuidade. Somente Rueda e Marcos Chedid, do Red Bull Bragantino, afirmaram que preferiam medidas menos radicais do que comprar uma briga judicial pelo futebol.
“Os dois ponderaram se não criaríamos uma animosidade muito grande com o governo. Se enfrentaríamos isso ou não. Não foram tão enfáticos, mas o Rueda pediu para pensarmos na judicialização, assim como o Chedid”, explica Rinaldo Martorelli, presidente do Sindicato de Atletas Profissionais do Estado de São Paulo.
“Ele [Rueda] falou que precisamos ver o lado da saúde e que precisamos achar um entendimento para o futebol continuar. Fizemos um meio termo, de não radicalizar”, acrescenta Chedid.
Entre os torcedores, a fala de Rueda caiu como um posicionamento corajoso, mas teve efeitos reversos internamente. O clube foi o primeiro que falou em parar o futebol. Em enquete feita pela Folha de S.Paulo com as 40 agremiações que disputam as séries A e B do Brasileiro, apenas Chapecoense e Brasil de Pelotas se colocaram favoráveis à paralisação.
Além dos clubes, quem também se posicionou foi o técnico Lisca, do América-MG, que desabafou ao vivo na TV antes de uma partida contra o Athletic, pelo Campeonato Mineiro, e o treinador Abel Ferreira, do Palmeiras, durante uma entrevista coletiva. “Vamos seguir o que a Federação Paulista de Futebol definir, confiando nos protocolos adotados pela entidade, visando à segurança de todos os participantes”, disse Rueda, em novo posicionamento do clube após questionamentos da Folha de S.Paulo. O Santos, assim como a federação, não citou os motivos para a mudança de tom.
A Federação Paulista ainda não revelou qual será a estratégia definitiva para cumprir o calendário, apesar da proibição do governo estadual e a negativa do Ministério Público de São Paulo (MP-SP) para a realização de práticas esportivas até o final de março, afetando diretamente, pelo menos, três rodadas do estadual.
A dificuldade para os clubes e a FPF agora é a de achar outro lugar para jogar. O Rio de Janeiro foi sondado no início, uma movimentação que buscava o efeito de fazer pressão sobre o governador João Doria (PSDB). O governador do Rio, Claudio Castro (PSC), afirmou primeiramente que o estado receberia o torneio de “braços abertos”, mas depois recuou. A principal alternativa, que era a de levar os jogos para Minas Gerais, minguou após o anúncio do secretário de saúde do governo de Minas Gerais, Fábio Baccheretti, que decretou a proibição de jogos de futebol de equipes de outros estados em território mineiro. “Estamos considerando inúmeras hipóteses, a atual é sobre jogar no Mato Grosso do Sul”, conta Martorelli.
Agora com apoio irrestrito dos clubes, a entidade busca anunciar logo uma solução para que a bola siga em jogo.