Militares se distanciam de Bolsonaro, mas mantêm forte resistência ao petismo
Forças Armadas também observam as chances de Sergio Moro no pleito eleitoral
Na busca pela reeleição, o presidente Jair Bolsonaro (PL) procura manter o apoio de uma parcela específica do eleitorado: a ala militar. As Forças Armadas, no entanto, já não se mostram mais tão adesistas ao capitão reformado.
As instituições castristas evitam transparecer vínculos políticos e deixam claro que serão fieis ao chefe do Palácio do Planalto, não importa quem seja.
Na semana passada, em entrevista à Folha de S. Paulo, o comandante da Força Aérea Brasileira (FAB), Carlos de Almeida Baptista Junior, assegurou que, caso o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), líder das pesquisas de intenção de voto, saia vitorioso das eleições, receberá continência como comandante supremo das Forças Armadas.
No Planalto, a declaração foi vista como “infeliz” por Bolsonaro, por ser lida como uma sinalização à oposição, apesar de não ter sido essa a intenção de Baptista Júnior.
A decepção dos militares com Bolsonaro é evidente, mas é fato também que Lula segue sendo malvisto na caserna, em razão da imagem de corrupção deixada pelos tempos da Lava-Jato. Mais do que a preferência pelo candidatos, no entanto, prevalece o respeito à ordem constitucional.
É o que defende o general Paulo Chagas, militar reformado. “O atual comandante da Aeronáutica soube, com precisão, deixar claro que as instituições são órgãos de Estado, e não de governo, o que significa dizer que, seja quem for o presidente eleito, terá a lealdade constitucional das Forças. Os militares como cidadãos, em sua maioria, votaram em Bolsonaro em 2018, mas nunca estiveram ‘fechados’ com ele, como não estiveram ‘fechados’ com nenhum outro presidente”, destaca.
Chagas relata um “número significativo” de militares decepcionados com Bolsonaro. Afirma que eles não confiarão o voto ao presidente no primeiro turno e devem optar pela candidatura de Sergio Moro (Podemos).
Porém reconhece que, caso a disputa do segundo turno fique entre o atual presidente e Lula, não há chances de escolherem o petista. “Essa atitude é de foro íntimo de cada um e não pode ser interpretada como coletiva. Hoje, baseado na minha percepção pessoal e na de outros militares com quem mantenho contato, vejo que há um número significativo de militares que não votará mais em Bolsonaro no 1º turno. Mas, ao mesmo tempo, desconheço quem pense em votar em Lula da Silva tanto no 1º como no 2º turno”, complementa.
O deputado federal Capitão Augusto (PL-SP) está confiante. Diz que, no primeiro turno, Bolsonaro pode até perder alguns votos da ala militar. Mas, na segunda votação, se o oponente for Lula, não há a menor possibilidade de isso ocorrer. “O PT sempre foi inimigo das polícias. Não há a menor possibilidade de votarem no Lula. Vão estar 100% com Bolsonaro”, afirma.
O general da reserva Carlos Alberto dos Santos Cruz (Podemos), ex-ministro da Secretaria-Geral do governo, também faz ressalvas ao alinhamento automático com Bolsonaro. “As instituições que compõem as Forças Armadas têm a cultura de cumprir a Constituição, e não existe possibilidade de preferência institucional por qualquer candidato. Individualmente, cada um vota em quem quiser. Não existe essa “continuação” com Bolsonaro nem aproximação com o outro candidato, o ex-presidente Lula. Isso é exclusivamente individual”, ressalta Santos Cruz.
O distanciamento da caserna com o Palácio do Planalto pode ser observado em três movimentos, segundo a analista de risco político da Dharma Politics, Raquel Borsoi. Ela lembra que, em janeiro, o comandante do Exército, general Paulo Sérgio, endossou as diretrizes de combate à covid-19 na Força, considerando vacinação, distanciamento, uso de máscaras e a proibição de espalhar fake news sobre a pandemia.
Houve, ainda, o atrito entre Bolsonaro e o diretor-presidente da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), Antônio Barra Torres — que é almirante da Marinha — a respeito da vacinação contra a covid. Por último, a sinalização do comandante da Força Áerea, de prestar continências a quem quer que ocupe o Poder.
“Esses três movimentos são um sinal de que, para alguns — não podemos generalizar —, o “pedágio” de seguir alinhado ao presidente tem se tornado caro. Não entendo que o cálculo seja feito devido à situação social, nem que as Forças irão se alinhar a Lula por acreditarem ser o candidato a solucionar os problemas do país.
As Forças Armadas têm conversado com todos os candidatos. O elemento-chave da questão é que, independentemente do resultado eleitoral, as Forças Armadas são um ator importante no debate e na dinâmica política atual e não poderão ser ignoradas por quem ascender ao Planalto”, analisa
Alcides Costa Vaz, professor de relações internacionais da Universidade de Brasília (UnB) e membro da Associação Brasileira de Estudos de Defesa (Abed), aponta que a resistência a Lula no meio militar responde ao aspecto ideológico. “Bolsonaro ainda tem um grande apoio entre integrantes da corporação. No segundo turno, o que vai determinar é a forma que cada militar avalia a expectativa em Bolsonaro e uma eventual mudança de governo. O fator ideológico dentro das Forças tem peso significativo, o que favorece mais a candidatura de Bolsonaro do que Lula”, conclui.
Fonte: CB